Nem no túmulo Paulo Freire deixará seus inimigos em paz. Eles o veem pela janela, pelas palavras, no vento, no sol, nos sonhos e pesadelos, inclusive o governo aí posto.
Não é sem razão. A leitura de mundo que ele tanto defendia é radicalmente diferente do letramento. Ler a sociedade brasileira, sua construção histórica, o papel das classes, de cada etnia, o significado da cor no Brasil, traz efetivamente desconforto para muitas pessoas, inclusive para cada um de nós.
Quando voltou do exílio, ele veio várias vezes aqui para a região de Juazeiro, a convite de D. José Rodrigues, até hoje considerado o "bispo dos excluídos", ou "o profeta do Semiárido". Passava semanas conosco, numa boa roda de conversa, como se fosse mesmo numa roda de bar. Não havia praticamente hora para acabar e ninguém queria sair dali. Um dia, cansado, ele disse: "agora vou sair. Quero ver também os passarinhos e as plantas".
Hoje me sinto na obrigação de dar um testemunho pessoal.
Quando cheguei ao sertão – vínhamos em grupo -, janeiro de 1979, a paróquia de Campo Alegre de Lourdes nos colocava nas comunidades para "formar comunidades, fazer educação política e alfabetizar as crianças". Então, na comunidade do Pajeú, durante uns 20 dias, eu tentava ensinar as crianças a ler pelas palavras geradoras "fome e sede". Era a realidade do sertão daquele tempo. Hoje melhorou pelo menos 80%.
Passaram-se quase 40 anos daqueles dias. Então, abastecendo o carro num posto de gasolina de Casa Nova, uma mulher desceu de uma vã e veio diretamente na minha direção. Ela disse: "você é o Gogó". Respondi: "sim". Ela continuou: "você me reconhece? " Eu respondi que lembrava dela, mas não me recordava de onde. Então ela disse: "você me alfabetizou quando eu era criança lá no Pajeú. Eu sou uma das gêmeas".
Então, me recordei dela criança instantaneamente. Univitelinas, ela e a irmã estavam todos os dias nas aulas.
Confesso que a surpresa foi total. Eu não acreditava que aqueles poucos dias eram suficientes para iniciar alguém nas primeiras letras. Mas, não era só o que ela queria dizer, e concluiu: "estou fazendo faculdade em Petrolina e tudo começou com aquelas primeiras letras".
O Brasil e o mundo devem muito a Paulo Freire, talvez acima de qualquer imaginação. O Papa Francisco disse à viúva dele que já leu "Pedagogia do Oprimido". Paulo Freire será sempre um fantasma a assombrar aqueles que querem perpetuar sociedades opressivas. Aprender a ler o mundo é sempre um perigo.
O que o governo Temer quer fazer com a pessoa de Paulo Freire é do tamanho da própria insignificância.
Por Roberto Malvezzi (Gogó)
8 comentários
13 de Jul / 2016 às 01h22
Bonita mensagem, mas posso resumir da seguinte frase. A elite com quem o golpista Mixel Cunha se juntou prefere mandar dinheiro para a Suica a ajudar o povo a se educar.
13 de Jul / 2016 às 01h29
Lula volta com o voto do povo. A elite nao aguenta ver um nordestino ter conquistado o coracao do povo com trabalho, hombridade, honradez, visao e dialogo. CUnha e TEMerOSSO so ditadura e fome.
13 de Jul / 2016 às 01h31
Lula volta com o voto do povo. A elite nao aguenta ver um nordestino ter conquistado o coracao do povo com trabalho, hombridade, honradez, visao e dialogo. CUnha e TEMerOSSO so ditadura e fome.
13 de Jul / 2016 às 08h33
Em primeiro lugar vale um questionamento; onde o governo interino (ainda) do Presidente Michel Temer quer atingir ou macular a vida, história e a obra do Educador Paulo Freire. Fica evidente que essa insinuação na conclusão desse pobre texto é para os menos inteligentes o fim que justifiquem os meios para a velha retórica desse inconformado "viúvo do poder bolivariano". A leva de jovens idealistas que aqui chegaram, trazidos para trabalhar nas pastorais da "nova igreja católica" tinham como objetivo maior chegar as comunidades mais distantes e carentes dessa região para fazer doutrinação política e claro, os objetivos para serem alcançados passavam pela necessidade de tirar as pessoas da ignorância absoluta e dar-lhes o mínimo de capacidade de compreensão, isso só com a alfabetização. O método PAULO FREIRE foi o escolhido e a sua eficácia é inquestionável, fica nisso o grande legado deixado por essa iniciativa. Se analizarmos outros aspectos vimos o interesse explícito de influnciar na formação política das comunidades com um unico viéis ideológico e a máxima do "nós contra eles". Os resultados não deixaram de serem alcançados e a dinastia petista desses últimos 14 anos é a prova mais evidente dessas conquistas. Graças a imprensa livre e as ferramentas de comunicação globalizada os dogmas e as bandeiras que tremulavam probidade, compromissos com os menos favorecidos, fortalecimento do Estado como agente supridor e tantas outras mostraram serem apenas cortinas para disfarçar um projeto nefasto de poder que além de aparelhar a máquina pública tinha como objetivo roubar e enriquecer os seus dirigentes maiores. A lona do circo caiu e ainda alguns insistem na defesa do "PETRALHISMO" comendo pão com mortadela.
13 de Jul / 2016 às 08h57
ainda esperando o dia em que o articulista fará um texto mea culpa dos MUITOS erros do PT...que inclusive permitiram que uma figura como Temer chegasse ao poder. Mas o PT nunca erra né? Infalivel como os papas...
13 de Jul / 2016 às 10h57
Qual a opinião desse " ambientalista" sobre o projeto Novo Chico de Michel temer ? Se fizer 1% já vai ter feito mais que o PT pelo São Francisco
13 de Jul / 2016 às 18h36
Tive a felicidade e o privilégio de participar de 2 encontros com o prof.Paulo Freire. Um dele durou 1 ou 2 semanas, no CTL da Diocese de Juazeiro.Sempre sou muito grato pelo convite da equipe paroquial local.
13 de Jul / 2016 às 22h47
Viúvo você arrasou. É isso mesmo, mais a propina no centro. E esse rapazinho doutrinado só tem gogó....