Por mais que alguns se esforcem em ocultar essa verdade, é indisfarçável como as práticas democráticas sofreram, nos últimos tempos, uma visceral mudança conceitual. Passou a ser proibitivo alguém assumir postura contrária ou de combate aos princípios nocivos que abastecem a sustentação do Projeto de Poder do partido dominante. Tantas foram as suas justas lutas, no passado, pela liberdade em todos os sentidos, que era de se imaginar que a conquista do poder se revelaria uma forma exemplar de convivência com as divergências e o respeito ao direito inalienável do pensamento livre de qualquer cidadão, sobretudo quando ele se materializa no combate ao crime infiltrado nas instituições públicas. Mas, a verdade tem sido outra com um grande contingente de pseudos-intelectuais que, ao invés de usarem argumentos convincentes que defendam as causas inglórias de uma inepta gestão pública, preferem buscar justificativas de amparo nos erros cometidos por adversários, além de desrespeitarem com expressões de baixo nível aqueles que exercitam o direito de se manifestarem livremente. E, como se não bastassem as atitudes isoladas dos sectários, ainda há correntes do governo que querem aprovar uma lei de controle das comunicações, o que significa instituir um desastroso modelo de censura à imprensa, cuja anomalia é típica das ditaduras que tanto combatem da boca pra fora, a exemplo de Cuba e Venezuela.
Tenho por dogma respeitar as posições contrárias, mas continuarei atento aos fatos que embalam esse barco à deriva...
O grande desencanto em que vive toda a sociedade brasileira diante do baixíssimo nível de moralidade de que se reveste o comportamento das pessoas, com maior evidência nas atitudes dos principais atores que atuam nas instituições públicas em geral, desde os agentes menos expressivos às arraias graúdas, sinaliza, permanentemente, a expectativa de que uma luz seja acesa no final do túnel, indicando que tudo isso é temporário e de que algo de novo irá acontecer nesse deplorável cenário.
Naturalmente que isso não surgirá do nada, sem que haja uma ação firme de alguma liderança comprometida com essas transformações, não importa se de formação política, religiosa ou cultural, mas que tenha o poder do convencimento na implantação de conceitos para uma nova sociedade. Quando o cronista Vladimir Safatle emitiu a frase “um país que precisa da refundação radical de sua República”, a qual citei na crônica anterior, obviamente que a sua metáfora queria nos conduzir ao entendimento de que precisamos recomeçar todo o processo de formação do nosso caráter, trocando-se a OPERAÇÃO LAVA JATO por uma completa OPERAÇÃO DE LAVAGEM MORAL, de modo que se consolidasse uma nova República, constituída de homens de bem e de respeito.
Lamentavelmente as nossas lideranças têm nos passado um sentimento de aceitação desse perfil vigente, como se fosse suficiente o investigar e punir (este último, aliás, nem sempre acontece!). Por exemplo, nas oportunidades em que as autoridades mais representativas falam para grandes plateias ou dão entrevistas coletivas, nada melhor que palavras mais incisivas fossem colocadas, expressando esse desejo de mudança comportamental. Ao invés disso, utilizam-se das frases de efeito que provocam risos de aprovação, mas que nada constroem de positivo.
Em recente entrevista coletiva, a Presidente, na ânsia de se defender do mar de lama que vem dando grande notoriedade negativa ao seu governo, usou uma expressão muito inadequada para justificar que toda essa sujeira é muito antiga, quando afirmou: “A corrupção não nasceu hoje. Ela é uma senhora bastante idosa neste país e não poupa ninguém. Ela pode estar em qualquer área, inclusive no setor privado”. Creio que as “senhoras idosas” não aprovaram essa infeliz declaração... Além dela não ter dito nenhuma novidade sobre essa herança maldita, apenas tornou evidente certa dose de resignação. Não basta dizer, como consolo, que “nunca se permitiu investigar tanto” como agora, esquecendo que essa é uma obrigação do Estado. O que se deseja é vê uma atitude determinada de quem tem o poder de estimular um processo de mudança, ainda que tardio...
O jogador Gerson, craque campeão do mundo em 1970, ao fazer um comercial em 1976 de uma marca de cigarro, utilizou uma frase que se tornou emblemática como definição daqueles que querem levar vantagem em tudo, sem se importar com questões éticas e morais: “Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Leve vantagem você também”. Foi aí que surgiu a Lei de Gerson, hoje praticada por muitos.
Nada ilustra melhor o comportamento dessa “senhora bastante idosa” (!) do que lembrar a sábia composição de Luiz Gonzaga e João Silva, intitulada “Uma Pra Mim Outra Pra Tú”, que teve a intenção ingênua de definir a disputa pelas mulheres do salão, mas que, no mundo da corrupção em que vivemos, poderia caracterizar a divisão dos recursos públicos em percentuais previamente definidos, a exemplo das propinas do Petrolão:
Cumpadre fique quieto vai por mim.
Vamo lá que eu tô contando separando direitim (2x).
Uma pra mim, uma pra mim, uma pra tú, outra pra mim.
Uma pra mim, outra prá tú, uma prá mim, Outra pra mim... (2X)
Autor: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público – Salvador – BA.
11 comentários
30 de Mar / 2015 às 08h52
Uma esperança pra mim, outra pra tu, outra pra mim, outra pra tu... Vamos dividir nossas esperanças igualmente para que possamos voltar a acreditar que esse país lindo e de riquezas naturais incalculáveis e com um povo de coração tão aberto e tão acolhedor, possa voltar a ter orgulho de ser Brasileiro. (Salvador-BA).
30 de Mar / 2015 às 08h55
Parabéns. Concordo plenamente. O desrespeito à ética, moralidade e civilidade (dentre outras) já passou dos limites, há muito. Os integrantes e defensores do governo (e o partido "chefe") são bons de discurso e a culpa ou início dos problemas sempre se deu/ocorreu com os outros. Como a infeliz comparação com a "senhora idosa". Não poderia ela se tornar séria, com um partido sério, mesmo com a referida idade? Nos resta lutar por um Brasil melhor, saindo do armário (no bom sentido) e indo para as ruas. É sempre bom ler suas crônicas. Tua postura, me parece, é a mesma de outros tempos. Continue escrevendo. Alimente, com boas crônicas, seus amigos. (Florianópolis-SC). _________ Por situação pessoal, passei mais de uma (01) hora) aguardando a noiva para realização de casamento civil (realizado fora do expediente e das dependências da Serventia - Cartório). Não se tratava de cerimônia religiosa e a noiva, "prá fazer bonito", atrasou 1h e 10 min. Hoje, o chique é cumprir horário. Mas poucos praticam isso!
30 de Mar / 2015 às 09h17
Como sempre, maravilhoso texto! (Feira de Santana-BA).
30 de Mar / 2015 às 09h20
Agenor, mais uma vez, você nos brinda com excelente texto. Parabéns! (Salvador-BA).
30 de Mar / 2015 às 09h24
Agenor, esta sua cronica demonstra uma situação muito simples: a classe política brasileira sempre abusou dos subterfúgios para justificar sua incompetência e para esconder o uso do estado para seu benefício próprio. E embora tenhamos um presidente da república que usa e abusa de retóricas para justificar o injustificável, temos um status político que mantém benefícios incompatíveis com a realidade econômica brasileira. Entre a corrupção e o clientelismo do estado, temos a mordomia dos cargos públicos federais ocupados pelos políticos. Se os assessores, começando pelas câmaras de vereadores e indo até o congresso fossem trocados por professores, policiais e outras ocupações realmente necessárias, teríamos um Brasil melhor. Quanto mais cargos inúteis indicados politicamente existirem, mais esta canção deste nosso inesquecível Luiz Gonzaga será um retrato atual da política brasileira. Em todos os níveis. De todas as formas. Foz do Iguaçu-PR.
30 de Mar / 2015 às 09h27
Caro Agenor, , É bom o dia quando se enriquece o saber viajando na cultura e no bom linguajar dessa nossa tão rica língua. Apesar das dificuldades que tenho passado fico sempre na esperança de dias melhores, pois não rezo e nunca rezarei nessa cartilha de levar vantagens. Quero aqui dar meu testemunho de uma passagem como fiscal de obra na duplicação da BR-101 em Sergipe, onde tive o desprazer de fiscalizar a tão poderosa Construtora, que pediu o meu afastamento da obra, por discordar dos métodos como conduziam os trabalhos, mostrando claramente que eu era uma ameaça ao desempenho das maracutaias praticadas pela construtora e a empresa fiscalizadora Continue enriquecendo o nossa cultura com suas belas crônicas. A musica Karolina com K de Luis Gonzaga se refere a partilha do cachê oferecido a dupla de sanfoneiros que se revezavam na festa, e a vantagem a que se refere faz parte da cultura da nossa raça miscigenada. Abraço, Adolfo- Belém do Pará
30 de Mar / 2015 às 09h34
Que dia e hora é o sepultamento dessa idosa? Será que ela morrendo, ainda haverá jeito para o nosso Brasil? Ou o DNA dessa idosa já circula na veia de todos os políticos brasileiros? Ao invés do ser ou não ser, vou usar o crê ou não crê num país melhor? Parabéns pela crônica! (Salvador-BA).
30 de Mar / 2015 às 10h15
Muito boa! (Salvador-BA).
30 de Mar / 2015 às 11h17
IMAGINO o Grande Agenor queimando as pestanas para nos brindar com tamanha verdade, centrado sempre nas verdades que são transmitidas através das oitivas e depoimentos de todos os tipos... IMAGINO sua atenção e preocupação em todos os domingos nos alertar sobre esse assunto agora tão corriqueiro o ano inteiro... IMAGINO ainda que ele tem até vontade de se debruçar em assuntos que não sejam esses, mas essa senhora não tem deixado... ACORD@DINHO PERDEU O HORÁRIO MAS NÃO PERDEU O COMENTÁRIO!!! rsrs eita rimou...
30 de Mar / 2015 às 13h05
BOM DIA, CARO AGENOR, LENDO ESTA CRÔNICA ME VEIO A LEMBRANÇA QUE O ATUAL PARTIDO DOMINANTE CONQUISTOU O PODER, CREIO, QUE GRAÇAS A PENSAMENTOS IGUAIS AO MEU, QUE VOTEI NO LULA SÓ NA PRIMEIRA ELEIÇÃO, POIS PENSEI QUE UM TRABALHADOR QUE PERDEU UM DEDO EM UMA METALÚRGICA E QUE TAMBÉM COMO MUITOS DE NÓS ESQUENTAVA MARMITA EM CIMA DE UM PEDAÇO DE MADEIRA COM QUATRO PREGOS E UMA LATINHA DE ÁLCOOL EMBAIXO, SABERIA DAR VALOR AO TRABALHADOR E TENTAR MELHORAR A VIDA DELES. INGENUIDADE MINHA, DEPOIS VIM A DESCOBRIR QUE AQUELE DEDO PERDIDO NAO FOI ACIDENTE, FOI DE PROPÓSITO PARA CONSEGUIR UMA APOSENTADORIA. TÃO LOGO SAÍRAM NOTÍCIAS SOBRE A JBS FRIBOI É DO FILHO DO LULA, JA SAÍRAM NOTÍCIAS TAMBÉM QUE O FRIBOI TÁ VENDENDO MAMINHA POR PICANHA, TÍPICO DESSA GENTALHA MESMO. MAS VAMOS EM FRENTE, E PARABÉNS POR NOS PREMIAR COM MAIS ESTA CRÔNICA. (SÃO PAULO-SP).
30 de Mar / 2015 às 20h10
No dia 1º de abril, dia da mentira, os brasileiros vão fazer um apitaço, buzinaço e baterão panelas para protestar contra as mentiras de Dilma, o PT e a corrupção. Os protestos pacíficos começam às 20 hs e vão durar um minuto. Onde você estiver nessa noite e nessa hora, faça a sua parte!!