Tratamento com cannabis medicinal enfrenta preconceito e desinformação sob recortes racial e social, diz médica baiana

A importação de produtos à base da planta cannabis (popularmente conhecida como maconha) teve significativo aumento no Brasil em 2023.

Dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em julho, apontava para uma subida de 93% em relação aos 12 meses anteriores. No Brasil, o uso recreativo da planta é ilegal.

O crescimento da importação ocorre em meio a uma tendência global de redescoberta de princípios ativos para tratamento de diversas doenças. No entanto, a desmistificação os usos da erva às propriedades terapêuticas enfrentam barreiras para além do preconceito. Para a médica baiana Mariane Ventura, de 29 anos, há um recorte social e racial na questão.

"A maconha é mal vista na periferia. Então você tem que quebrar esse paradigma, no caso de uma pessoa, que vem de comunidade, de que aquilo é uma planta. Uma pessoa que mora numa comunidade vulnerável, ela convive com toda situação da guerra às drogas, então ela vê, e associa aquela planta àquilo. Você precisa desmistificar pra essas pessoas", conta a médica.

De acordo com Mariane, que é médica da família, quando a barreira do conhecimento é rompida por pacientes ou responsáveis, a importância de um médico disposto a trabalhar sem preconceitos é fundamental.

"Tem muitas pessoas de baixa renda que também procuram tratamento, mas aí vão em um médico específico e escutam coisas super preconceituosas. Falam que nunca viram alguém inteligente usar. Que as pessoas que usavam Cannabis era burras porque a Cannabis destrói os neurônios", conta.

"Acho que também tem um recorte racial. De preconceito mesmo, e desinformação", acredita.

Para Mariane, a falta de uma indústria nacional é outro vilão para o tratamento. Na visão dela, isso ocorre por um temor político-social em se discutir o tema e democratizar o tratamento.

"É um tratamento restrito porque esbarra em questões políticas. O que temos que entender que a mesma planta, que é tratada de uma forma na política de drogas, tem algumas políticas voltadas para o uso medicinal. Só que as políticas voltadas para questão da droga tem um impacto, também, no uso medicinal. Por exemplo, temos dificuldade na produção nacional, que seria uma das formas de democratizar", conta.

"Se a pessoa quer, por exemplo, que o SUS cubra, atualmente, primeiro você tem que achar um profissional que prescreva, e nem todos prescrevem. E segundo que você pode sim tentar por via judicial pelo SUS, você pode judicializar. É um processo um pouco demorado", admite.

Nas redes sociais, Mariane também dá dicas e informações sobre como o uso da Cannabis pode ser benéfico para públicos diversos.

Desde 2015 a Anvisa permite a importação de produtos com princípios ativos extraídos da planta. E a partir de 2019, a agência reguladora passou a permitir a venda de produtos com substâncias da cannabis em farmácias.

No entanto, é proibida a importação de a cannabis in natura, e a qualquer parte da planta, ou foco onde ficam as chamadas "flores", que concentram os princípios ativos medicinais e psicoativos da cannabis.

g1 Ba Foto Agencia Brasil