“Toda tirania é uma insensatez”

Qual é o mais insensato dos tiranos? Para a professora Marília Fiorillo, não existe resposta para essa questão – ela acredita que toda tirania é insensata, o que muda é apenas a sua forma. “Em geral, o tirano é ambicioso e vaidoso, uma qualidade muito russa, evidente no caso do totalitário Stalin e do atual tirano russo Putin, mas pode também ser discreta e implacável, uma virtude mais chinesa.” 

A colunista argumenta ainda que o tirano pode ser delirante e cometer atrocidades indescritíveis, “como aconteceu com o fracassado pintor austríaco chamado Adolf Hitler, que principiou tímido no pós-Primeira Guerra, mas, a cada posição de poder que conquistava, mais mergulhava no delírio de se tornar o César imortal do Terceiro Reich”.

Marília prossegue em sua tipologia dos tiranos, acrescentando na lista figuras como as de Idi Amin Dada (“tosco e grotesco”) e Pinochet. Em geral, observa ela, o tirano é tolerado pelo medo e boas alianças e sempre usa a força bruta, embora esteja sempre pronto a se valer de ardis políticos, como fez Mao Tsé-Tung, “ao incitar nos bastidores a Revolução Cultural”.

 As características dos tiranos não param por aí, já que também há os fracos de caráter, e aqui a colunista se vale da literatura para citar, como exemplo, o personagem usurpador Macbeth, da tragédia shakespeariana. “Embora as peças de Shakespeare sejam aulas magnas de política, em Macbeth há essa particularidade: ele é um tirano fora de lugar, não tem os atributos para tal, nem a coragem nem a malícia, só lhe resta deixar um rastro tresloucado de destruição.”

Ela conclui: “A deformação de Macbeth é a fraqueza de caráter, é por isso que ele se torna o principal carrasco de si mesmo. Cego pela desorientação do cargo, indiferente ao destino dos escoceses, é, no final, abandonado por todos; ele fracassa porque se deu a uma tentação que exigia mais do que pedia. Toda a tirania é uma insensatez, mas não há insensatez maior do que a do tirano que sucumbe à sua própria insignificância”.

Marilia Fariolitto-Professora de Filosofia Política e Retórica da Escola de Comunicações e Artes da USP. Prêmio Jabuti em 1981 e 1999, trabalhou como jornalista em Veja e Folha de S. Paulo, e foi editora de política internacional na revista Isto É.

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