Seminário evidencia as Mulheres no protagonismo da Convivência com o Semiárido e na luta contra a Desertificação

As práticas agroecológicas, de Convivência com o Semiárido e o modo de vida das Comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto que já se provaram eficientes na defesa do meio ambiente e no cuidado com a Caatinga. Assim, no Dia Internacional de Combate à Desertificação, data criada pela Organização das Nações Unidas (ONU), essas foram algumas das fontes de inspiração enaltecidas em um evento realizado em Juazeiro, que reuniu, entre representantes de organizações da sociedade civil, movimentos sociais, instituições de ensino e agentes do Poder Público, mais de 150 pessoas para debater o combate à desertificação e a mitigação dos efeitos da seca.

O evento foi realizado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e a Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Combate à Desertificação. A iniciativa contou ainda com a parceira da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) e da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados e apoio da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF) e a Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf).

O Seminário “Dia de Combate à Desertificação” colocou as mulheres no centro do debate, com o tema “Mulheres: Suas Terras, Seus Direitos”, título que está sendo abordado também em uma campanha mundial. E as mulheres foram protagonistas das discussões ao longo do evento. Entre elas estava a agricultora Ana Lúcia Silva, da Comunidade Tradicional de Fundo de Pasto Lagoa do Meio, em Juazeiro. Durante a fala, ela destacou diversas iniciativas desenvolvidas pelas comunidades tradicionais, que mantêm o modo de vida “[...] com produção orgânica, com o cuidado com a terra, preservando, recuperando com as práticas de Recaatingamento [...]”.

Ana Lúcia rebateu o discurso ainda equivocado que existe, de que “não chove no Semiárido” e também enfatizou a necessidade de políticas públicas de captação de água da chuva. “No dia que cai uma chuva, a gente não tem onde segurar aquela água que escorre tanto. Então, a gente está precisando é de tecnologias para captação de água[...]”. Além dessa fala marcante, outras mulheres, tanto as presentes na mesa, quanto as que participaram, ressaltaram o protagonismo e a força das mulheres.

Quando questionada sobre a avaliação das mulheres no Seminário e da importância dessa representatividade em um evento nacional, dona Ana Lúcia nos contou que foi “De grande valia, principalmente pra gente que vive esse modo de vida de Comunidade Tradicional de Fundo de Pasto [...] A gente vem compartilhar algumas práticas que a gente desenvolve nas comunidades, no nosso Território. É um espaço de estar colocando todas as conquistas, as lutas, as preocupações, os desafios. A gente está realmente somando, buscando participar desses espaços, compartilhando e também adquirindo novas experiências”.

A secretária Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais e Desenvolvimento Rural Sustentável, do Ministério do Meio Ambiente, Edel Moraes, afirmou durante os debates, a partir de todos os relatos das presentes que “as mulheres apontam o caminho”, que é de levar em consideração os saberes e as práticas dos povos tradicionais.

Antes dessa roda de escuta de mulheres, o evento teve uma mesa com participação de representantes de instituições que atuam no Semiárido. O integrante da coordenação da ASA Pernambuco, Pedro Paulo de Carvalho, enfatizou que “É preciso agir já em defesa da Caatinga” e ainda reforçou a necessidade de defender a Convivência com o Semiárido e romper com a ideia de combate à seca. O reitor da Univasf, Telio Nobre Leite, reafirmou o papel da Educação nessa agenda climática e que a Universidade está à disposição para fortalecer as estratégias e ações de Convivência com o Semiárido, inclusive com a criação de curso com esse tema. A afirmação desse compromisso foi celebrada pelas organizações presentes.

O momento inicial também foi marcado por reivindicações. Representantes de organizações que integram a Rede Ater Nordeste de Agroecologia entregaram para as representações do Poder Público um documento com propostas de políticas públicas, por exemplo, de acesso à água, saneamento básico rural e produção de energia descentralizada no Semiárido. O coordenador institucional do Irpaa, Clérison Belém, pontuou na ocasião que essa reivindicação não é apenas pra ficar na entrega. “[…] A gente quer o retorno dos compromissos dessa proposta!”. O deputado Fernando Mineiro (PT/RN) se comprometeu, durante sua fala, a levar o documento para a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados.

O Diretor de Combate à Desertificação, do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Alexandre Henrique Pires, afirma que recebe esse documento da Rede Ater Nordeste de Agroecologia “Com muito cuidado, com muito zelo, porque são demandas que tratam da nossa agenda, tem adesão, aderência àquilo que a gente está discutindo dentro do Departamento de Combate à Desertificação e que a gente possa tratar disso dentro do Governo, nas várias instâncias, com os vários órgãos que são responsáveis por essas demandas”.

Houve ainda outras manifestações dos/as participantes, entre elas a luta das Comunidades Tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto contra o Marco Temporal e o protesto em defesa da Área de Preservação Permanente do Velho Chico, em Juazeiro.

“Escutar aqui as reivindicações que tratam da agenda climática, sobretudo, o grupo que traz a preocupação com a tentativa da prefeitura de Juazeiro de reduzir a área de preservação permanente da margem do São Francisco, que é algo extremamente preocupante; quando as Comunidades de Fundo e Fecho de Pasto apresentam suas demandas, no sentido dos seus reconhecimentos, da definição e demarcação dos seus territórios [...] Para a gente, receber essas demandas, significa reafirmar o nosso compromisso de estar no Ministério do Meio Ambiente e fazer com que essas agendas sejam tratadas pelo Estado, como é devido e é responsabilidade do Estado”, afirma Alexandre Pires.

Com a participação de representantes de instituições como o Instituto Nacional do Semiárido (INSA) e Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), além de órgãos de estados do Nordeste, a programação final do evento pautou as perspectivas das próximas ações. Entre as definições, foi divulgado que na edição do Semiárido Show 2023 será realizado outro seminário para debater as contribuições das pesquisas científicas nessa retomada da agenda de combate à Desertificação.

Alexandre Pires enfatizou que além da retomada da pauta no âmbito Federal, estão sendo desenvolvidas ações para apoiar os estados na atualização dos planos estaduais de Combate à Desertificação. O objetivo é chegar em 2025 na 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP-30), com avanços significativos nessa agenda. O evento, que é considerado a principal cúpula mundial sobre assuntos do clima, vai acontecer em Belém, no Pará.

Para alcançar esses avanços, muitos são os desafios. E eles surgiram nas discussões, pontuados pelas organizações participantes. Por exemplo, é preciso ainda mudar o cenário da concentração de terras em poucas mãos e rever a forma como os empreendimentos de geração de energia ditas “sustentáveis” estão se espalhando pelo Semiárido.

Esta última pauta, inclusive, foi um dos temas da fala do integrante da coordenação nacional da ASA, Cícero Félix. Ele apontou, que assim como foi possível construir mais de um milhão de cisternas, também é preciso ousar e buscar ter “[…] 1 milhão de telhados solares no Semiárido brasileiro. Nós não queremos apenas produzir energia renovável para autoconsumo, nós queremos participar do mercado de energia, nós queremos ter participação na renda que as energias renováveis geram nesse país. E assim nós podemos ter uma janela de saída do Bolsa Família e da extrema pobreza”, defendeu durante a participação na mesa. Cícero, enfatizou ainda a importância da destinação de orçamento público para garantir investimentos nas políticas públicas destinadas ao Semiárido, a exemplo da construção de cisternas de consumo, de produção e de água na escola.

Durante a mesa, a vice-reitora da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), Lucia Marisy Ribeiro, anunciou que a instituição pretende lançar em agosto deste ano uma Escola de Cidadania e Direitos, que terá o objetivo de contribuir na retomada do apoio e da organização de povos e comunidades tradicionais, minorias políticas e pessoas em situação de vulnerabilidade.

O evento foi enaltecido pela organização, pela escuta das lutas e dos anseios de quem está na ponta, fazendo a diferença contra a degradação ambiental. “[…] Ter diversas instituições, estarmos aqui enquanto Governo, pautando desde o chão, desde o Semiárido, ouvindo as pessoas que fazem a vida, que produzem a vida e que também são as últimas fronteiras em defesa de um clima saudável, de um mundo mais justo, não só reivindicando, trazendo alternativas, mostrando soluções. Eu termino muito agradecida, muito satisfeita por esse evento, enquanto Ministério do Meio Ambiente, em nome da nossa ministra Marina Silva, agradecer a todos os presentes”, afirma Edel Moraes.

Alexandre Henrique Pires reforça a volta do compromisso do Governo Federal com essa pauta e a importância da parceria no desenvolvimento das ações. “Fazer esse evento aqui na Univasf, buscando a participação da sociedade, da ASA, das organizações de pesquisa e dos governos, é uma forma da gente assegurar que esse tema está sendo retomado, assim como está sendo retoma a Política Nacional de Combate à Desertificação, pelo Governo Federal, para que a gente possa buscar construir ações, sinergias, pactuar nas várias instâncias, com os vários atores políticos, a retomada dessa Política para que e a gente não só combata os processos da desertificação, mas a gente previna também”.

E, muito mencionada no Seminário e apontada como um caminho para mitigar os possíveis efeitos do agravamento das mudanças climáticas, a Convivência com Semiárido esteve no centro das atenções. Cícero Félix avalia que o evento foi exitoso para essa agenda que as organizações da ASA fazem, defendem e acreditam. “Enfrentar a desertificação significa dizer garantir melhores condições de vida para as populações que vivem no Semiárido brasileiro. E o caminho está sendo colocado já tem algum tempo, que é o caminho da Convivência com o Semiárido. Por isso, para nós da ASA, é fundamental e estratégico esse momento, porque botar na agenda nacional o enfrentamento à desertificação é botar na agenda a Convivência com o Semiárido”.

No evento houve ainda o lançamento da campanha global de prevenção e combate à desertificação com o título “Mulheres: Suas Terras, Seus Direitos”, que tem como uma das protagonistas uma agricultora do Território Sertão do São Francisco, Maria das Neves, da comunidade Caiçara, no distrito de Massaroca, em Juazeiro. Os/As participantes ganharam mudas de plantas nativas da Caatinga; 100 unidades foram disponibilizadas pela direção da Agrofloresta do Espaço Plural da Univasf.

As atividades do Seminário aconteceram no auditório do Complexo Multieventos do campus Juazeiro da Univasf e foram transmitidas ao vivo pela webtv da Universidade, a TV Caatinga.

 

Eixo Educação e Comunicação do Irpaa