Perda definitiva de olfato e paladar, a angústia de muitos que tiveram covid

01 de Apr / 2021 às 20h30 | Coronavírus

De repente, três dias após o teste positivo para covid-19, "tudo tinha gosto de papelão". Elizabeth Medina, 38 anos, perdeu o paladar e o olfato. Foi em março de 2020, o início da pandemia. Um ano depois, ela está desesperada com a ideia de não recuperá-los.

Conselheira escolar em uma escola de ensino médio de Nova York, ela consultou otorrinolaringologistas, neurologistas e neurocirurgiões, tentou sprays nasais e faz parte de um grupo de pacientes que estão experimentando um tratamento com óleo de peixe.

Para estimular o olfato, ela coloca especiarias em todos os pratos, ervas aromáticas em seus chás e constantemente cheira uma pulseira com óleos essenciais. Tudo em vão.

Esta mãe de dois filhos afirma ter perdido muitos prazeres do dia a dia, como comer e cozinhar. E chora diariamente há meses.

Medina está entre o número crescente de pessoas com "anosmia" de longa duração, um distúrbio frequentemente subestimado que se tornou uma das marcas da pandemia.

Enquanto a maioria das pessoas que perdem o paladar e o olfato pelo coronavírus os recuperam de três a quatro semanas, "10% a 15%" os perdem por meses, diz Valentina Parma, psicóloga da Temple University na Filadélfia e membro de um consórcio internacional de pesquisadores, o Consórcio Global para Pesquisa Chemosensory (GCCR), que foi formado no início da pandemia para estudar este problema.

Por enquanto, essa consequência pode afetar pelo menos dois milhões de pessoas nos Estados Unidos e mais de 10 milhões em todo o mundo, explica. O paladar e o olfato são frequentemente considerados menos essenciais do que a visão ou a audição.

Embora sejam essenciais para a socialização ("escolhemos parceiros em parte por causa de seus cheiros", enfatiza Parma), os médicos tendem a considerar sua perda menos séria do que outros efeitos da covid de longa duração.

No entanto, seu desaparecimento costuma ser acompanhado de problemas nutricionais, além de ansiedade e até depressão, afirma o médico.

Como outros que enfrentam a "anosmia", Medina acabou encontrando conforto e solidariedade em um grupo de apoio organizado por um hospital próximo à sua casa.

Grupos desse tipo se multiplicaram nas redes sociais: a associação AbScent - formada em 2019 no Reino Unido e cuja notoriedade disparou com a pandemia - viu o número de seus membros explodir em um ano de 1.500 para mais de 45.000 em suas diferentes plataformas, de acordo com sua fundadora, Chrissi Kelly.

Na página da associação no Facebook, a pergunta que assombra Medina se repete como um refrão: "Será que algum dia recuperarei meu paladar e meu olfato?" Com o conhecimento que existe até agora, é "muito difícil prever como as coisas se desenvolverão", diz Parma.

Porém, sabe-se que uma evolução da anosmia para "parosmia", ou seja, a falsa percepção de odores, em que o cheiro de lixo é sentido ao se inalar o aroma do café, por exemplo, é um bom indicador de cura a longo prazo.

O que se pode fazer são exercícios diários para "sentir" vários cheiros diferentes - como óleos essenciais - é nesta fase o único tratamento recomendado sem reservas: funciona em 30% dos casos após três a seis meses de exercícios, afirma a pesquisadora.

Diante dessa incerteza, "veteranas" da anosmia como Chrissi Kelly, que por muito tempo perdeu o paladar e o olfato após sofrer sinusite em 2012 e perdê-los novamente com a covid, e Katie Boateng, uma americana que não sente cheiros e sabores desde 2009, se tornaram quase celebridades.

Elas compartilham suas experiências, levando a comunidade médica a reconhecer a gravidade desses sintomas e intensificar as pesquisas.

Boateng criou o Smell Podcast em 2018, uma mina de informações e conselhos para seus companheiros de infortúnio. E agora ela faz parte de um grupo de pacientes, o Patient Advocacy Group, que ajuda a orientar as pesquisas do consórcio GCCR.

Embora ela não tenha mais esperanças de cura, ainda espera "guiar pesquisas que resultarão em uma cura para as pessoas no futuro", diz. Enquanto aguardam o avanço dos estudos, muitos se exercitam diariamente, às vezes com a ajuda de uma "treinadora" como Leah Holzel.

A especialista em culinária, que perdeu o olfato de 2016 a 2019, treinou seis novatos de anosmia desde o início da pandemia na redescoberta dos aromas. Para manter a autoestima elevada, muitos se apegam às mensagens otimistas que às vezes aparecem nas redes sociais.

“Já se passou quase um ano desde que perdi o paladar e o olfato, e agora estou praticamente recuperada”, escreveu Dominika Uhrakova, de 26 anos, da Inglaterra na página da AbScent no Facebook. “Tem sido longo e doloroso e este grupo tem me ajudado a não enlouquecer (...) Fiquem fortes, não percam a esperança. Boa sorte a todos!”
 

Correio Braziliense

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