Artigo – Salve o Nordestino: “Antes de tudo, um forte”

08 de Oct / 2020 às 15h14 | Espaço do Leitor

Nenhum texto que se proponha a homenagear o Nordestino, no dia que lhe foi reservado no calendário oficial, 08/outubro, pode prescindir de iniciá-lo reafirmando a histórica frase do escritor Euclides da Cunha: “O sertanejo é, antes de tudo, um forte” (Os Sertões, 1ª Edição, 1902). Essa afirmativa, tão singela quanto verdadeira, ultrapassa o tempo e se eterniza na memória de quantos conhecem a força e a coragem da gente do sertão:  O trovador usa a frase como mote dos seus versos, quando nas feiras livres exalta o inconfundível perfil do nordestino. Os políticos dela se aproveitam quando na empolgação dos seus discursos, nem sempre transmitindo a verdade desejada.

Não basta fazer poesia ou tecer altos elogios em oratórias cheias de empolgação, mas é preciso ter a sensibilidade para sentir e interpretar o verdadeiro significado do adjetivo “forte” de Euclides. Também não tenho a pretensão de fazê-lo. A capacidade de resistência da gente sertaneja vai além dos limites de meras definições literárias ou científicas. O suor com sabor de sangue que lhe corre nas faces parece emergir das suas entranhas como um bálsamo para a pele, que queima sob a intensidade do sol. Não se quebranta com pouco sofrimento, nem se arrefece ante os grilhões da dor, da sede e da fome, como se lhe fossem alimentos de vida. É um forte que está mais para o verdadeiro sentido de fortaleza, muralha, que resiste bravamente às adversidades.

A enxada do sertanejo parece ser a caneta que escreve no solo do semiárido, ressequido e tórrido, os seus sonhos e esperanças. Imagine, o homem do sertão sonha! Sonha que come e nesse momento se alimenta. Sonha que chove e nesse instante tem a sensação de que gotas de água lhe banham o corpo marcado pelo sol. Planta a semente e sonha que ela vai nascer. Os sonhos e fantasias têm o poder de tornar a sua vida menos sofrida.

No rosto do catingueiro as rugas do sofrimento e do cansaço parecem desenhar pequenos córregos pelos quais rolam gotas de suor que se precipitam ao solo, como se desejassem irrigar a terra de novas esperanças. A lição de resistência, de pertinácia, de fé, de humildade, de esperança, e até de saber sonhar, tem de servir de exemplo aos mortais urbanos. Não é um aprendizado fácil, sobretudo quando as autoridades constituídas ao invés de darem as condições básicas que permitam a convivência do trabalhador com as dificuldades climáticas e naturais destroem a essência principal da sua índole que é a coragem pelo trabalho. Impõem-lhe a cultura da doação e da malemolência. É o estímulo ao nefasto princípio de dar o peixe ao invés de ensinar o homem a pescar.

Será que vamos assistir impassíveis ao desenvolvimento do conceito de que melhor que trabalhar e dar exemplo às novas gerações de filhos e netos é viver sustentado pelas benesses oficiais?  Até quando este povo deixará de usar das suas reservas morais históricas para resistir e enfrentar os apelos a uma vida de inércia e indolência que lhe está sendo oferecida, ou quase imposta pelos interesses eleitoreiros?

Mesmo sabendo que esse sertanejo obstinado “é, antes de tudo, um forte”, incorremos no risco de desconhecer os seus limites e, assim, um futuro incerto pode nos reservar um povo decadente e destruído no cerne da sua estrutura: a luta pela vida através do trabalho. Expresso, aqui, as minhas homenagens a esse povo guerreiro, de forte índole e honestidade, e que, unido, jamais será vencido!

Autor:  Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público – de Salvador-BA 

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