Artigo – Um parlamentarismo disfarçado?

08 de Mar / 2020 às 23h00 | Espaço do Leitor

Não tenho dúvidas de que, seja o Presidencialismo ou o Parlamentarismo, ambos serão sempre descaracterizados, em algum momento, pela ação dos homens que os representam. Embora ambos simbolizem a razão de ser da Democracia, a sedução do poder pelos homens exerce a sua influência malévola que deturpa e promove determinados desvios e imperfeições no sistema. Como diz a sabedoria popular, se quiser saber quem é o homem, dê-lhe PODER e uma caneta.

Mesmo que no Presidencialismo o Presidente seja escolhido pelo voto popular nas Eleições Diretas, é inquestionável que não existe um equilíbrio na correlação de forças entre o Executivo e o Legislativo, visto o poder deste último em derrubar vetos presidenciais, aprovar ou não Medidas Provisórias, ratificar ou não indicações de candidatos a Juízes dos Tribunais Superiores, ou confirmar ou não os candidatos a Embaixadores no Exterior, entre outras discrepâncias.

Parece pouco? Tem muito mais, pois na análise da Lei Orçamentária Anual-LOA. do Governo Federal, a aprovação de todo o conjunto orçamentário – de interesse nacional -, foi cercada de longas demandas em torno da verba de 30,4 bilhões de reais desejada pelo Parlamento, de obrigatória liberação para as tais Emendas Impositivas dos senhores parlamentares! Interessante é que o governo vetou a elevação de 15,4 para 30,4 bilhões e a Câmara de Deputados, por uma expressiva votação de 398 votos, aprovou o Veto Presidencial! Mas, dentro da vergonhosa regra do “Toma lá, dá cá” o governo reduziu 15,0 bilhões das tais IMPOSITIVAS e transferiu esse valor - 10 para a Câmara e 5 para o Senado Federal -, através de outra rubrica contábil chamada de EMENDAS DE RELATOR, o que significa que esse montante será administrado unicamente por um congressista. Tira por um lado e entrega pelo outro!

Já no Parlamentarismo nada mais explícito de que o Sistema é constituído por Parlamentares eleitos pelo povo, mas com a diferença fundamental de que a eles cabe a responsabilidade de eleger o Presidente e o 1º. Ministro que irão exercer os cargos de Chefe do Estado e governante do Poder Executivo, situação em que não pode ser desprezível a existência de uma linha direta de alinhamento e subordinação. Nesse caso, com o poder mais amplo de colocar e tirar governo, imagine o leitor se o Poder Executivo terá qualquer independência para o exercício das suas prerrogativas! E aqui voltamos à sabedoria de novo: tudo leva a crer que será um pau-mandado! Ou não?

É óbvio que a função do Poder Legislativo é fiscalizar, debater leis que sejam encaminhadas pelo Executivo e ser um contrapeso aos atos e projetos dele emanados, bem como oferecer a sua contribuição eficiente e patriótica no fortalecimento das Instituições oficiais. Não se pode conceber, contudo, que o debate político honesto e democrático seja transformado num embate em defesa dos interesses pessoais ou corporativistas. É triste de se ver que, em inúmeras oportunidades, o campo da discussão sobre projetos e reformas se transforma num mercado de grandes negócios, cujas condições envolvidas nem sempre suportariam qualquer grau de transparência.

Reitero aqui a minha posição de reconhecimento do importante papel do Legislativo, como um dos Três Poderes Institucionais que validam o nosso Sistema Político Nacional, em todos os níveis. O que mexe com as minhas convicções, e no que entendo está coerente com o pensamento de vasta camada do povo brasileiro, é a falta de consciência dos senhores parlamentares de que esse Poder Legislativo tem de se ajustar, urgentemente, à realidade do país, a começar pelo tamanho das duas casas: 513 Deputados Federais e 81 Senadores! Bem que uma Reforma Política podia nos brindar com a redução da Câmara para 250 Deputados e o Senado para 54 (dois senadores por Estado).

Anarquizar com os Poderes constituídos e suas Instituições oficiais não contribui para o fortalecimento do processo democrático, mas, a sociedade não pode silenciar diante da inércia ou de ações nem sempre muito ortodoxas praticadas por muitos dos seus representantes.

Assim, diante de tanta dependência e submissão quase aviltantes, é preciso, inclusive, que seja esclarecido: vivemos num PARLAMENTARISMO DISFARÇADO, ou não?

Autor: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público - Aposentado do BB - de Salvador-BA.

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