Prisão em 2ª instância: mudança de entendimento e suas consequências

08 de Nov / 2019 às 23h00 | Espaço do Leitor

Vitor Luiz Costa, especialista em direito penal do Massicano Advogados. Membro Efetivo da Comissão Especial de Direito Penal da OAB/SP 

Tema que vem gerando discussão junto ao cenário jurídico é a validade da prisão após condenação confirmada em 2.ª instância, se esta deve ser cumprida de maneira imediata, ou deve primeiro esgotar todos os recursos junto às instâncias superiores, no caso STJ e STF. 

Nesse sentido, temos duas correntes que estão em constante embate. 

A defensora do cumprimento imediato da pena após confirmação da condenação em 2ª instancia, diz que, o Tribunal ao avaliar a sentença condenatória proferida em primeira instância, possui total capacidade de analisar todos os pormenores da decisão, bem como as provas apresentadas e os fatores que motivaram a condenação, assim, avaliando se houve a correta análise das provas, se não houve eventual cerceamento de defesa, se as provas apresentadas no processo não foram contaminadas por alguma irregularidade, bem como, a fundamentação do magistrado de 1º grau ao proferir a condenação. 

Assim, após essa análise feita pelo Tribunal, se não for encontrada nenhuma irregularidade na sentença proferida pelo Magistrado de 1º grau, a ratificação da condenação é medida que se cabe, para que, seja dado efetivo cumprimento da sentença condenatória, e afastar da sociedade, criminoso condenado em processo regular. 

Em contrapartida, a corrente que defende que a confirmação de sentença condenatória em 2ª instância não poderia validar o imediato cumprimento da pena diz que, mesmo que o Tribunal em sede recursal analise sentença condenatória e entenda que a sentença proferida pelo magistrado de 1º grau foi devidamente fundamentada não possui nenhum fator que enseje reforma ou anulação e venha a determinar prisão imediata, estaria “retirando” o direito do condenado a recorrer às instâncias superiores, assim, violando o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como, a violação ao artigo 5º da Constituição Federal, inciso LVII, (que garante que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória), pois, mesmo que tenha sido confirmada pela 2ª instância, ainda há meio recursais para questionar a condenação, devendo, portanto, o condenado permanecer em liberdade até o esgotamento total dos recursos. 

Os tribunais de 2ª instância, em suma, após confirmarem condenação, determinam o início do cumprimento imediato da pena ao condenado. Nessa linha, também acompanha o STJ e o STF. 

A Segunda Turma do STF manteve decisão individual do ministro Gilmar Mendes que negou a libertação de todas as pessoas presas após condenação em segunda instância. A decisão foi proferida por plenário virtual, modalidade feita on-line pelos ministros para julgar questões que tratam de jurisprudência consolidada. 

Agora, com a mudança na atual jurisprudência do STF, em tese, a decisão poderá beneficiar quase 5 mil presos, segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). 

Contudo, cumpre salientar, que não serão todos os presos beneficiados com  o novo entendimento, uma vez que cada caso é um caso, devendo ser analisadas as circunstâncias do crime e o grau de periculosidade do agente. Assim, entendemos que presos considerados perigosos ou que estiverem detidos preventivamente, por exemplo, não poderão ser beneficiados pela eventual mudança de entendimento do Supremo.

Claro que a mudança de entendimento por parte STF irá beneficiar em grande maioria quem possui poder aquisitivo privilegiado, pois, apresentar recursos em instâncias superiores (STJ e STF), demanda grande capacidade técnica do advogado, não sendo barata a mão de obra do profissional, por isso, somente uma pequena porção de condenados terá meios para chegar às instâncias superiores através de recursos. Nessa “pequena” parcela privilegiada não podemos deixar de citar inúmeros réus da operação Lava Jato. 

Todavia, a atual mudança de entendimento não nos aparece ser exatamente jurídica, já que o tema teve grande repercussão após as inúmeras prisões ocorridas em razão da operação, ou seja, a mudança no entendimento do STF nos parece mais política do que jurídica. 

Ponto que não foi bem aclarado com o atual entendimento do STF é que os principais beneficiados com essa decisão serão, em sua maioria, políticos e criminosos de colarinho branco. E, com perdão da palavra, o pobre, negro e excluído, jamais alçará um recurso até as instâncias superiores, primeiro por não possuir condições financeiras para custear profissionais com grande capacidade técnica para defendê-los, e segundo por não serem “membros” de destaque para chamar a atenção para um eventual julgamento de seus recursos em tempo recorde como vimos ocorrer ultimamente. 

Verdade seja dita, a mudança de entendimento do Supremo sobre a prisão em 2ª instância não irá favorecer a “minoria” (economicamente falando), os realmente favorecidos serão a minoria com alto poder econômico.

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