Há uma frase que se popularizou na Bahia, cuja origem da autoria é atribuída ao Governador Antônio Carlos Magalhães, in memoriam, que, embora possa ser questionada a legitimidade da origem, tem muito a ver com o seu conhecido e irreverente estilo político: “Para os amigos, tudo; para os inimigos, a lei”. Assim, como parece que esse conceito está disseminado em todo o país, passamos a entender porque há no Brasil 54 mil beneficiados com as vantagens da proteção oferecida por algum tipo de Foro Privilegiado, abrangente para um extenso universo de ocupantes de altos cargos públicos da máquina do Estado. A própria palavra “privilegiado” já encerra um repugnante sentido discriminatório perante a sociedade, que sempre se pergunta o porquê alguns gozam dessa benesse, parecendo até que são melhores que os outros cidadãos, quando, na verdade, são muito piores.
Ora, ora, o público fez campanha de abaixo-assinado digital e este foi entregue ao STF, o qual obteve dois milhões e cem mil assinaturas pedindo pela extinção de vantagens tão amplas, numa prova incontestável de como o povo brasileiro pensa e deseja um mínimo de igualdade de direitos. Se fosse extinto esse absurdo de maneira ampla e irrestrita, estaria o STF oportunizando ao país o início efetivo de sua recuperação moral, através da eliminação do critério de classificação e distinção dos crimes conforme a aparência, a cor, o cargo que exerce ou o nível social. Seria eliminado o princípio de nomeação para cargos públicos não pela competência ou a perspectiva de desempenho em benefício da população, mas, unicamente, com o fim de dar proteção e imunidade àqueles parceiros envolvidos em crimes. É uma atitude corporativista indigna e irresponsável de um governante, utilizar-se de uma exceção constitucional como regra para acobertar e defender aqueles que praticaram ou que continuam praticando crimes contra a ordem pública.
Já de algum tempo esse tema me cativa. Daí é que em 18/11/2016 aqui foi publicada a minha crônica “FORA...O FORO PRIVILEGIADO”, da qual me apraz reproduzir esse parágrafo, que está bem atual: “O Art. 5º da Constituição Federal estabelece a igualdade de direitos para todos os cidadãos, ao estabelecer que: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Por que não respeitar essa norma constitucional, aplicando a lei no julgamento por crimes cometidos de qualquer natureza, ao invés de distinguir com imunidades especiais pela prerrogativa da função uma casta de privilegiados”?
Mas, a decisão do STF, embora tenha alcançado o êxito esperado de redução da exagerada carga de processos sobre os seus ombros, tratou do “foro privilegiado” criando um outro tipo de privilégio: os senhores parlamentares federais só serão julgados no STF, doravante, mas, “no caso de crimes cometidos durante o mandato e relacionados com o exercício da sua função”. Significa que crimes por estupros, agressões à mulher ou outros sem ligação com o cargo, praticados agora ou anteriormente ao exercício parlamentar, serão da alçada de investigação e julgamento da 1ª. Instância onde o fato ocorreu! Isso significa que o STF será agora esvaziado de milhares de processos e estes recomeçarão a sua caminhada na cidade de origem do Deputado ou Senador, para desfecho final só Deus sabe em que década! Ou décadas!!!
Concordo com o colunista J.R.Guzzo, quando diz que só falta estenderem os benefícios da lei a “Juízes e Bandeirinhas de futebol”...! Os privilégios guardam tanta similaridade com a frase do ACM, que é possível aperfeiçoá-la: para esse seleto grupo, TUDO; para o restante dos 207,7 milhões de brasileiros, A LEI!
Mercê de algumas decisões monocráticas nem sempre muito coerentes, nutro o maior respeito pelo STF. Essa decisão sobre o foro, contudo, viabilizou que parlamentares envolvidos em processos não corram o risco de ficarem inelegíveis e, assim, foram blindados com uma visível sobrevida. Em decorrência de ter gerado essa falsa expectativa, a esperança do eleitorado de se livrar dos políticos com crimes sobre os ombros - como já teve a graça Divina de se livrar de alguns -, foi jogada no lixo, assim como o expurgo pretendido foi propositalmente adiado. Ou seja, foi gerado um engodo, quando o que se faz necessário é o irrestrito FIM DO FORO PRIVILEGIADO.
Autor: Adm. Agenor Santos, Pós-Graduação Lato Sensu em Controle, Monitoramento e Avaliação no Setor Público - Aposentado do Banco do Brasil – Salvador - BA.
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