Juiz indefere liminar de Paulo Bonfim: “A coisa pública não pode ser confundida com o bem privado”

Tentando cercear o direito de apresentar ao povo de Juazeiro as mazelas do governo municipal, que administrou o município por oito anos, a coligação ‘Pra Juazeiro Mudar Mais’, do candidato Paulo Bonfim (PCdoB), tenta impedir que a Coligação ‘Juazeiro no Coração’, liderada pelo candidato Charles Leão (PPS), mostre a sociedade os problemas existentes, principalmente na área da saúde.

A coligação de Paulo Bonfim entrou com representação alegando que Charles Leão apresenta informações inverídicas sobre o município de Juazeiro no seu guia eleitoral, bem como alega que Charles Leão tece críticas ao prefeito Isaac Carvalho. Porém a justiça indeferiu o pedido de liminar impetrado pela coligação do atual prefeito, que não apresentou indícios que as informações apresentadas por Leão sobre os problemas de Juazeiro sejam inverídicas.

Segundo a decisão do Juiz Eleitoral da 48ª Zona Eleitoral, José Carlos Rodrigues do Nascimento, “a coisa pública não pode ser confundida com o bem privado. É dizer, os bens e os servidores do município não são de propriedade do gestor público. E muito menos diz respeito ao candidato apoiado pelo prefeito local. Pelo contrário, a coisa pública deve está vinculada à sua finalidade máxima, que é o próprio interesse público e não o interesse de particulares”.

Ainda segundo a decisão, “uma coisa é a pessoa do candidato da representante, outra é a administração pública local. Que dizer, então, que não se pode tecer críticas para determinadas situações? Nesse diapasão, não vejo qual é a relação entre o candidato da representante e administração pública do Município de Juazeiro, para que possa ser apta a impedir que qualquer pessoa fale bem, ou mal, da gestão municipal”.

DECISÃO

PROCESSO:
Nº 3422 - REPRESENTAÇÃO UF: BA48ª ZONA ELEITORAL

Nº ÚNICO:
3422.2016.605.0048

MUNICÍPIO:
JUAZEIRO - BAN.° Origem:

PROTOCOLO:
1408072016 - 31/08/2016 12:26

REPRESENTANTE:
COLIGAÇÃO PRA JUAZEIRO MUDAR MAIS, REPRESENTANTE

ADVOGADO:
LUIZ VIANA QUEIROZ

ADVOGADO:
ANDRE MARIANO CUNHA

REPRESENTADO:
COLIGAÇÃO JUAZEIRO NO CORAÇÃO

ADVOGADO:
HERMES HILARIÃO TEIXEIRA NETO

ADVOGADO:
SARAH BARROS GALVÃO

ADVOGADO:
LUIZ GABRIEL BATISTA NEVES

JUIZ(A):
JOSÉ CARLOS RODRIGUES DO NASCIMENTO

ASSUNTO:
REPRESENTAÇÃO - DIREITO ELEITORAL - Eleições - Propaganda Política - Propaganda Eleitoral

LOCALIZAÇÃO:
ZE-048-48a. ZONA ELEITORAL/BA

FASE ATUAL:

03/09/2016 19:22-Retificado registro de publicação do Decisão Liminar efetuado em 03/09/2016 para: Publicação em 03/09/2016 Mural Eletrônico . Decisão Liminar de 01/09/2016. 

Publicado em 03/09/2016 no Mural Eletrônico

PROCESSO Nº: 34-22.2016.6.05.0048

REPRESENTAÇÃO ELEITORAL - COM PEDIDO DE LIMINAR

REPRESENTANTE: COLIGAÇÃO PRA JUAZEIRO MUDAR MAIS

REPRESENTADO: COLIGAÇÃO JUAZEIRO NO CORAÇÃO

Vistos, etc...

Trata-se de representação eleitoral levada a efeito pela COLIGAÇÃO PRA JUAZEIRO MUDAR MAIS, em face da COLIGAÇÃO JUAZEIRO NO CORAÇÃO, com pedido de liminar em antecipação de tutela de urgência, por supostas propagandas inverídicas e manipuladas, veiculadas, em blocos e inserções, nos dias 29 e 30 de agosto de 2016, nos turnos vespertinos e noturnos.

Em síntese, a representante aduz que as propagandas veiculadas ridicularizam a atual gestão com fatos sabidamente inverídicos. E que, por consequência, o candidato da coligação representada estaria sendo prejudicado, uma vez que este recebe apoio político do atual gestor municipal.

Fala que as informações propaladas são sabidamente inverídicas e difamatórias, utilizando-se de montagem e sem qualquer conteúdo de crítica eleitoral, para desvalorizar e desacreditar o candidato da coligação representante.

Descreve a fala do candidato a prefeito pela coligação representada, Sr. Charles Leão (fls. 02/03).

Diz que há manipulação da verdade, onde fora apresentado, pela representada, posto de saúde, supostamente sucateado, não se apresentando nome do bem público, endereço, e nem possuindo slogam ou timbre do Município, sequer sabe-se se era posto de saúde, e se estava localizado no Município de Juazeiro.

Aduz que a coligação falta com a verdade ao dizer que "falta profissionais, falta medicamentos e insumos de primeira necessidade, além do descaso generalizado" .

Fala, também, que a propaganda veiculada pela representada tenta incutir na mente do eleitorado a falsa ideia de que o candidato da representante possui alguma relação com o suposto sucateamento do sistema de saúde. 

Diz que se tem, dessa maneira, uma associação aleivosa, desleal, maliciosa, inverídica e desonesta, que tenta confundir o eleitorado, atingindo dezenas de milhares de pessoas, justamente na TV, de grande audiência na cidade. Afirmando que a propaganda, ora hostilizada, procura criar estados emocionais e passionais no eleitorado.

Afirma, ainda, que salta aos olhos que a representada veiculou programa eivado de calúnia, difamação e injúria.

Pede, de maneira liminar, antecipação de tutela de urgência, para ordenar que a representada, imediatamente, se abstenha de veicular, em televisão ou no rádio, as propagandas objetos dessa demanda.

Requer aplicação de multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), no caso de descumprimento da ordem judicial, bem como, no caso de desobediência, que seja expedido mandado de prisão e instaurado o processo criminal contra "os representados" .

Requer, outrossim, a citação da representada, a procedência da representação, a condenação da representada na perda, em dobro, do tempo indevidamente utilizado, e a intimação do Ministério Público para atuar no feito.

É O RELATÓRIO. PASSO A APRECIAR O PEDIDO DE LIMINAR.

Consoante Humberto Theodoro Júnior, o objetivo da jurisdição não é mais visto como apenas realizar a vontade concreta da lei, mas a de prestar a tutela ao direito material envolvido em crise de efetividade. Outrossim, é certo que, nos termos do art. 5º, XXXV, da CF, nenhuma lesão ou ameaça a direito será subtraída da apreciação do Poder Judiciário. 

Tutelar o direito é, pois, a função da Justiça. Contudo, uma coisa é a tutela e outra a técnica de que se serve o magistrado para realizar, nas inúmeras situações litigiosas, a tutela adequada. Nesse modo de ver, a tutela principal corresponde ao provimento que compõe o conflito de direito material, examinada de modo exauriente e definitivo.

Por outro lado, existem outras situações em que a duração do processo e a espera da composição do conflito geram prejuízos ou risco de prejuízos para uma das partes, comprometendo, sobremaneira, a efetividade da tutela de incumbência do Poder Judiciário.

Nessa linha de intelecção, surgem os conceitos de tutela antecipada e de tutela cautelar. Deveras, o que há de mais característico na tutela antecipada é que ela, antecipadamente, satisfaz, no todo ou em parte, a pretensão formulada pelo autor, concedendo-lhe os efeitos ou consequências jurídicas que ele visou obter com o ajuizamento da ação. 

Pois bem, a tutela provisória tem previsão nos arts. 294 e seguintes do novo Código de Processo Civil:

Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.

Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.

Essa é a classificação que leva em conta os fundamentos pelos quais o juiz pode deferir a tutela provisória. Ao concedê-la, ele deverá fundamentar a decisão na urgência ou na evidência, seja ela de caráter satisfativa ou cautelar.

A tutela de urgência será concedida quando houver "elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo" (CPC, art. 300, caput). Portanto, os requisitos cumulativos são o fumus boni iuris, isto é, a probabilidade do direito, e o periculum in mora, ou seja, o risco de que, sem a medida, o litigante possa sofrer perigo de prejuízo irreparável ou de difícil reparação.

Também, é importante destacar que, segundo a melhor doutrina, não restam dúvidas de que as tutelas provisórias (antecipada ou cautelar) podem ser concedidas no início do processo, liminarmente, ou seja, antes de ouvida a parte contrária.

Pois bem, em análise sumária, vamos analisar o pedido da representante. Inicialmente, vamos consignar que os patronos da autora, por diversas vezes, parecem confundir a administração pública municipal com o candidato da coligação representante.

Digo isso porque uma coisa é a pessoa do candidato da representante, outra é a administração pública local. Que dizer, então, que não se pode tecer críticas para determinadas situações? Nesse diapasão, não vejo qual é a relação entre o candidato da representante e administração pública do Município de Juazeiro, para que possa ser apta a impedir que qualquer pessoa fale bem, ou mal, da gestão municipal.

Este juízo já assentou, em outras decisões, que a coisa pública não pode ser confundida com o bem privado. É dizer, os bens e os servidores do município não são de propriedade do gestor público. E muito menos diz respeito ao candidato apoiado pelo prefeito local. Pelo contrário, a coisa pública deve está vinculada à sua finalidade máxima, que é o próprio interesse público e não o interesse de particulares.

Igualmente, uma das acepções do princípio da impessoalidade está ligada à ideia de vedação à pessoalização das realizações da administração pública, à promoção pessoal do agente público.

Outro aspecto digno de nota é no sentido de que, quando é para enaltecer as supostas qualidades da gestão pública municipal, o candidato da representante faz questão de se vincular, muitas vezes de maneira indevida, a essa administração. Por sua vez, quando se tecem críticas, a vinculação não é mais benquista. Falta, portanto, em análise superficial, razoabilidade nas alegações da representante.

Ora, qual o problema em se fazer críticas ou elogios à administração pública de certo município? Não me parece razoável proibir que o cidadão faça críticas a uma gestão pública, seja ele um comerciante, um servidor público ou, até mesmo, um candidato.

Com efeito, a própria legislação na seara eleitoral permite que o candidato, pessoalmente, exponha as realizações de governo ou da administração pública, bem como permite que sejam apontadas falhas administrativas e deficiências verificadas em obras e serviços públicos em geral.

Nesse sentido, é o que nos revela a Resolução TSE 23.457/2015, art. 53, §2º, c/c Lei nº 9.504/1997, art. 54, §2º, "será permitida a veiculação de entrevistas com o candidato e de cenas externas nas quais ele, pessoalmente, exponha: I - realizações de governo ou da administração pública; II - falhas administrativas e deficiências verificadas em obras e serviços públicos em geral; III - atos parlamentares e debates legislativos" .

Também chama atenção o fato de que, nas fls. 08/09, os patronos da representante pedem para expedir mandado de prisão e instauração de processo criminal contra "os Representados" . Com a merecida vênia, faltou aí um pouco de técnica jurídica. Falo isso porque, na demanda proposta, só há "um representado" (A COLIGAÇÃO JUAZEIRO NO CORAÇÃO). Segundo ponto, a coligação é uma espécie de pessoa jurídica, de existência temporária. Então, qual a lógica para se expedir mandado de prisão em desfavor da representada? Pedido impossível! Quer dizer, não há possibilidade de mandar "prender" uma pessoa jurídica.

Por derradeiro, quando se tratar de tutela provisória de urgência (art. 294, parágrafo único, do novo CPC), o deferimento da liminar, de plano, sem a ouvida do réu, deve ficar restrito às hipóteses em que se possa constatar, sem dificuldades, a probabilidade do direito alegado (fumus boni iuris) e a extrema urgência, quando ou não haja tempo hábil para ouvir o réu, ou disso possa resultar perigo para a eficácia da medida (periculum in mora). Esses dois requisitos devem estar presentes cumulativamente. 

Esses dois requisitos devem estar presentes cumulativamente (art. 294, parágrafo único, do novo CPC), para que, assim, se possa conceder o pedido de liminar. Nesse sentido, a jurisprudência é pacífica:

TJ-MG - Apelação Cível AC 10525020014839001 MG (TJ-MG) 

Data de publicação: 07/03/2016 

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL - CAUTELAR - SUSTAÇÃO DE PROTESTO - PRESENÇA DOS REQUISITOS LEGAIS - FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA - SENTENÇA MANTIDA. 1. Para o deferimento da liminar de sustação dos efeitos do protesto na ação cautelar inominada, se mostra necessário a presença dos requisitos legais do fumus boni iuris e do periculum in mora.

STJ - AGRAVO REGIMENTAL NA PETIÇÃO AgRg na Pet 9889 RJ 2013/0114824-1 (STJ) 

Data de publicação: 04/12/2013 

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. PETIÇÃO. PROCESSAMENTO IMEDIATO DE RECURSO ESPECIAL RETIDO NOS AUTOS. ART. 542 , § 3.º , DO CPC . EXCEÇÃO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA E CUMULATIVA DE FUMUS BONI JURIS E PERICULUM IN MORA. CASUÍSTICA EM QUE NÃO HÁ PERIGO DE IRREVERSIBILIDADE DA MEDIDA. FALTA DE DEMONSTRAÇÃO DE CHANCE DE ÊXITO RECURSAL. 1. A alteração legislativa na tramitação do recurso especial tem inegável relação com a racionalização do processo civil e com o almejo de imprimir-lhe maior eficácia, tendo o legislador optado, no caso de o recurso impugnar matéria de decisão interlocutória, por determinar o seu sobrestamento e retenção nos autos e, posteriormente, seu processamento apenas se e quando a parte interessada assim reiterar. 2. O abrandamento dessa regra, vale dizer, o imediato processamento do recurso especial nesses moldes, constitui, portanto, hipótese excepcionalíssima autorizada apenas quando houver real, concreta e comprovada possibilidade de causação de lesão grave e de difícil reparação, cabendo ao interessado evidenciar o periculum in mora, o fumus boni juris e a possibilidade de chance de êxito recursal. 3. Caso concreto em que o Município de Nova Iguaçu não demonstra a irreversibilidade da medida liminar que suspendeu o andamento de concurso público havido como ofensivo à moralidade e impessoalidade administrativas. 4. Demais disso, a tese que constitui o cerne da impugnação, tocante à ofensa ao art. 2.º da Lei n.º 8.437 /1992 por ter a medida liminar sido concedida sem a oitiva da fazenda pública municipal, tampouco apresenta inexorável chance de êxito em razão de a jurisprudência deste Tribunal Superior mitigar a vedação ali insculpida dadas as peculiaridades de cada caso concreto. 5. Agravo regimental não provido. 

In casu, portanto, em análise dos autos pelas vias da cognição sumária, entendo que não estão preenchidos os requisitos para a concessão da medida liminar inaudita altera parte. 

POSTO ISSO, indefiro o pedido de concessão de liminar.

Notifique-se a representada, para apresentar manifestação no prazo de 48 horas.

Ciência ao Ministério Público Eleitoral.

Cumpra-se. 

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Juazeiro, 01 de setembro de 2016.

José Carlos Rodrigues do Nascimento

Juiz Eleitoral da 48ª Zona

Ascom Coligação Juazeiro no Coração