O São Francisco, outrora conhecido como rio da unidade nacional – pela importância e relevância que teve no processo de colonização do país, – terminou esquecido e abandonado como via de transporte, papel que por longo tempo exerceu com grande eficiência e significânciaeconômica e social.
Era, então, praticamente a única alternativa de comunicação existente entre as várias comunidades ribeirinhas. Sucumbiu ao rodoviarismo, ideologia do setor de transportes que predominou a partir de meados do século passado.
Agora, felizmente, o Ministério dos Portos e Aeroportosanuncia a inclusão da hidrovia do São Francisco no seu programa de trabalho. A estimativa é que transporte cincomilhões de toneladas entre o Nordeste e o Centro-Sul do país já no primeiro ano de operação.
Segundo o ministro, ainda este mês será assinada a delegação à Companhia Docas do Estado da Bahia – Codeba (a cuja jurisdição já esteve vinculada, sem sucesso), e serão iniciados os estudos técnicos, em conjunto com a Infra, também empresa do governo federal. A licitação para concessão da hidrovia deve ser aberta em até um ano, prevê o ministro.
O conceito do projeto apresentado está correto, começando pelo trecho de 604 km, que liga Juazeiro (BA)–Petrolina (PE) a Ibotirama (BA), onde se encontra com a BR-242, importante rodovia federal que atravessa a Bahia horizontalmente, interligando o Oeste baiano aos portos da Baía de Todos os Santos, sendo hoje um importante corredor de exportação de grãos. À altura de Ibotirama já existe, na margem esquerda do rio, um estratégico terminal de embarque, que operou com milho – para abastecer aos produtores de ovos do Nordeste – soja e algodão.
Trata-se de uma hidrovia de baixo custo de implantação. Nesse trecho, o maior investimento de toda a hidrovia já está pronto desde 1979: é a eclusa de Sobradinho, vencendo um desnível de 32,5m. Permite a eclusagem de embarcações de 110m x 16m e calado de 3,5m (câmara de 120m x 17m), com um volume limite de capacidade de 14 milhões de t/ano. Ao longo do imenso Lago de Sobradinho os trabalhos se resumem a simples balizamento e sinalização.
A segunda etapa, com 172km, alcançará Bom Jesus da Lapa, ainda na Bahia, onde deverá ter uma importante conexão com a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL), já estando aí construída a maior ponte ferroviária da América Latina, entre os municípios de Serra do Ramalho e Bom Jesus da Lapa, com 2.900m de extensão evão central de 50m de altura. O médio São Francisco se oferece hoje ao desenvolvimento de um importante polo agro–suco–alcooleiro, que é inibido justamente pela dificuldade de transporte.
Na terceira fase, com mais 670km, chegará a Pirapora (MG), onde se interliga com todo o sistema de transportes do Centro-Sul do país. Apenas dragagem e a remoção de pequenos pedrais envolvem a implantação da hidrovia ao longo de todo o seu percurso.
Nos meus tempos de Senado dediquei boa parte do meu mandato a chamar atenção para (i) a importância do desenvolvimento da bacia hidrográfica do rio São Francisco, e (ii) a necessidade de revitalização do rio, tendo relatado duas comissões especiais, ambas por mim propostas, dedicadas à discussão do tema. Não é, contudo, perfil do Parlamento brasileiro cuidar de temas do desenvolvimento.
Em uma dimensão ou em outra, sobressai a importância da hidrovia do rio São Francisco como elemento-chave para o desenvolvimento de vasta porção do território nacional, beneficiando diretamente os estados de Pernambuco, Bahia e Minas Gerais e, indiretamente, toda a economia nacional.
Navegável desde o importante polo de fruticultura irrigada de Juazeiro–Petrolina, no trecho submédio do rio, até Pirapora, a hidrovia tem, hoje como ontem, enorme potencial econômico. Integra-se a inúmeras rodovias e à antiga Linha Centro da malha ferroviária baiana (originalmente Bahia and San Francisco Railway Company) – atualmente também abandonada pela concessionária Ferrovia Centro Atlântica – além do futuro Corredor Leste-Oeste, resultante do engate da FICO-FIOL, constituindo-se assim em importante conexão logística.
Certamente agora as antigas “gaiolas”, que no passado transportavam passageiros e cargas, cederão lugar aos comboios de barcaças que carregarão produtos agrícolas, minérios, fertilizantes e biocombustíveis, entre outros produtos, dinamizando toda esta vasta região do país. É, fora de qualquer dúvida, um projeto de relevante importância nacional.
Que volte o “Velho Chico”, o mais breve possível, a cumprir a sua saga de rio da unidade nacional!
Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional. Autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.
Fonte: Bahia Econômica
1 comentário
25 de Jun / 2025 às 09h08
Seria muito importnte já está no planejamento a revitalização e preservação do rio em primeiro lugar, e ter uma fiscalização eficiente e eficaz para acompanhamento desse transporte, já que vai ser bastante volumoso, para não poluir as águas do velho Chico. Não tendo esse cuidado, nós ribeirinhos, pagaremos essa conta, com águas poluidas e com sabor de Óleo Diesel.