Elas no comando: A força feminina transforma as Bacias Hidrográficas Baianas

No Dia Internacional da Mulher, a Bahia celebra um avanço significativo na gestão dos recursos hídricos: a crescente presença feminina na liderança dos Comitês de Bacias Hidrográficas.

Atualmente, mulheres ocupam cargos estratégicos em 07 dos 14 Comitês do estado, desempenhando um papel essencial na formulação de políticas, implementação de projetos e fortalecimento da governança ambiental.

O protagonismo feminino na gestão da água na Bahia acompanha uma tendência nacional de crescimento da participação das mulheres em espaços de liderança. Segundo dados recentes, as mulheres ocupam 38% dos cargos de liderança no Brasil, mas na alta gestão esse número cai para 28%¹. No setor público, a participação de mulheres na administração federal aumentou de 29% em 2022 para 34% em 2024². Na Bahia, o empreendedorismo feminino representa 45% das instituições formalizadas³, indicando avanços, mas também desafios a serem superados.

Liderança Feminina: Transformação e Desafios

A representatividade feminina nos Comitês reflete mudanças estruturais na governança hídrica. No CBH Leste, Lucélia Berbert lidera a única diretoria composta exclusivamente por mulheres no estado. “Nossa gestão cumpre tudo o que é decidido dentro das regiões e das reuniões do Comitê. Antes, muitas decisões não eram cumpridas, e hoje garantimos que todas as ações sejam executadas com transparência e comprometimento dos nossos membros”, afirma.

No CBH Grande, Lia Dognani destaca que sua liderança não é apenas uma conquista de gênero, mas de competência. “É muito honroso estar na presidência do Comitê, porque mostra que nós estamos aqui não por ser mulher, mas por competência. Nós queremos ocupar cargos por competência, não pelo meu gênero.” Ela afirma que o maior desafio que enfrentará em sua gestão, é fortalecer a participação dos membros e ampliar o conhecimento sobre a bacia. “Nosso principal desafio é trazer novamente os membros para uma participação mais efetiva e uma busca por recursos para que a gente consiga um conhecimento maior da nossa bacia. A Bacia do Rio Grande é muito grande, então vamos levar conhecimento, o aperfeiçoamento dos membros para que nós tenhamos uma discussão mais equiparada por temas que competem à nossa bacia.”

Luciana Kiriri, 2ª secretária do CBH Grande e primeira mulher indígena a integrar a diretoria, reforça a importância e o impacto de sua eleição, que pode servir de inspiração para outras mulheres indígenas. “Quando eu recebi o convite para entrar na diretoria do Grande, eu fiquei surpresa, assim como a minha comunidade toda. Só aqui no Oeste nós temos 14 etnias, e eu fiquei como referência.” Ela enfatiza a necessidade de aproximar o Comitê das comunidades. “Nosso objetivo é integrar essas duas realidades, quero quebrar esse gelo entre o Comitê e as Comunidades Tradicionais, quero tentar fazer esse laço. Porque é muito ruim ficar nessa distância sem a gente saber escutar o outro.”

Protagonismo que Inspira

Para Ana Odália Sena, presidente do CBHPIJ e coordenadora do Fórum Baiano de Comitês de Bacias Hidrográficas, o aumento da participação feminina na gestão hídrica ainda enfrenta desafios. “As mulheres têm um papel central no gerenciamento e conservação da água. Desde a mulher como dona de casa, que cuida e orienta sobre o uso correto da água no seio da família, até as gestoras que desenvolvem ações que promovam qualidade de vida e proteção ambiental para que a água tenha sua função almejada por toda a sociedade. Quando comecei, o número de mulheres na presidência dos Comitês era bem menor. Hoje, já avançamos, mas ainda há muito a conquistar”, destaca.

Ela também ressalta a necessidade de políticas públicas mais efetivas para fortalecer os Comitês. “Temos enfrentado vários desafios, como a implementação dos instrumentos de gestão em todos os Comitês, onde alguns têm Planos de Bacias, outros não. Também não temos cobrança no Estado, e isso dificulta as ações dos Comitês”, explica.

Apesar dos desafios, essas líderes seguem promovendo impactos reais por meio de projetos de educação ambiental, articulação com universidades e fortalecimento da participação social na gestão da água.

Impactos na Gestão Hídrica e Perspectivas para o Futuro

O protagonismo feminino nos Comitês de Bacias Hidrográficas vai além da representatividade: ele impulsiona uma gestão hídrica mais inclusiva, eficiente e inovadora. Essas líderes não apenas ocupam espaços estratégicos, mas também promovem a integração das comunidades, o fortalecimento da participação social e a conscientização ambiental.

As histórias de Lucélia, Lia, Luciana e Ana Odália revelam como a liderança feminina pode transformar desafios em oportunidades, inspirando novas gerações e moldando políticas públicas que refletem as necessidades reais da sociedade. Ao ocupar cargos de liderança com competência e comprometimento, essas mulheres constroem pontes entre o conhecimento técnico e as demandas sociais, contribuindo para a sustentabilidade das bacias hidrográficas baianas.

 

Perguntas para Lucélia Berbert – Presidente do CBH Leste

O CBH Leste é um Comitê onde toda sua Diretoria é formada por mulheres (presidente, vice e secretária).

A representatividade feminina nos Comitês reflete mudanças estruturais na governança hídrica. No CBH Leste, Lucélia Berbert lidera a única diretoria composta exclusivamente por mulheres no estado. “Nossa gestão cumpre tudo o que é decidido dentro das regiões e das reuniões do Comitê. Antes, muitas decisões não eram cumpridas, e hoje garantimos que todas as ações sejam executadas com transparência e comprometimento dos nossos membros”, afirma.

  1. O CBH Leste é o único comitê da Bahia com uma diretoria composta exclusivamente por mulheres. Como isso impacta a gestão dos recursos hídricos na região?

Nós tivemos uma aceitação muito boa dentro de todos os membros do Comitê e todos os lugares que nós chegamos e vamos nos apresentar como diretoria do Comitê, nós somos muito bem tratadas. As pessoas fazem assim o possivel para nos atender. Então eu acho que o impacto foi positivo em termos 03 mulheres na diretoria do comitê. Foi a primeira vez em que aconteceu isso no CBH Leste e está dando muito certo. Então o impacto na região foi muito positivo.

  1. Você percebe mudanças na forma como as discussões e decisões acontecem dentro do comitê desde que a diretoria passou a ser formada apenas por mulheres?

Também acho que essas mudanças foram positivas porque a gente procura cobrir tudo o que é decidido dentro das regiões e das reuniões que acontecem, o que consta nas atas. Eu participei de um período da diretoria anterior, só na questão da eleição. Então não posso dizer o que acontecia na diretoria anterior, que era uma diretoria mista. Mas pelas atas que eu li, as atas não eram cumpridas, então as decisões passaram a ser cumpridas e todos os membros nos auxiliam, então também essa mudança é positiva. Tudo o que pedimos aos membros, nos somos muito bem atendidas.

  1. Quais foram os principais desafios e oportunidades que vocês encontraram ao assumir essa liderança?

O principal desafio para nós, foi cumprirmos a agenda do comitê. Porque antes era muito difícil de ser cumprida. e nós tomamos uma posição de que nós tínhamos que cumprir tudo o que fosse decidido. Por exemplo, a Câmara Técnica de Educação Ambiental, que nós iniciamos no ano passado e nesse ano a gente já vai atuar dentro dos municipios com essa parceria de educação ambiental em relação aos recursos hídricos. Então esse foi os principais desafios. E a oportunidade, nós estamos tendo por sermos mulheres. estamos sendo bem tratadas, bem acolhidas, então nós achamos isso uma forma de oportunidade, principalmente em relação aos parceiros que estamos sendo muito acolhidas. Está sendo maravilhosa essa experiencia só com mulheres.

 

Perguntas para Ana Odalia Sena – Presidente do CBHPIJ e Coordenadora do Fórum Baiano de Comitês de Bacias Hidrográficas

Ana Odália é presidente do CBH Peruípe, Itanhém e Jucuruçu, localizado no extremo sul da Bahia e coordenadora do Fórum Baiano de Comites de Bacias Hidrográficas.

1 - Como coordenadora do Fórum Baiano de Comitês de Bacias Hidrográficas,

qual a sua visão sobre o crescimento da participação feminina na gestão das

águas na Bahia?

Resposta

As Mulheres têm um papel central no gerenciamento e conservação da água. A

mulher como dona de casa, que cuida e orienta sobre o uso correto da água no

seio da família; passando pelas mulheres profissionais, que enfrentam muitas

vezes a falta de sistemas apropriados, como por exemplo a coleta do lixo,

tratamento e disposição de esgotos domésticos; chegando ao das mulheres

gestoras que desenvolvem ações que promovam qualidade de vida e proteção

ambiental para que a água tenha sua função almejada por toda sociedade.

Na gestão de recursos hídricos, as mulheres ainda são minorias, quando eu

comecei a assumir liderança na gestão hídrica ainda era em menor o número de

mulheres na presidência dos CBHs, hoje avançamos um pouco, porém temos

muita luta pela frente.

2 - O CBHPIJ também tem você como mulher no cargo de liderança. Como essa

representatividade tem contribuído para a governança hídrica na região?

Resposta

Normalmente, as mulheres são mais sensíveis aos problemas das águas, pois

lidam com isso mais de perto. Tenho feito muitas articulações com lideranças

locais, buscando sensibiliza-los para o cuidado com a gestão hídrica, temos

projetos de Educação Ambiental em andamento, sempre com parcerias,

prefeituras e as Universidades. Temos um projeto em andamento com o

município de Ibirapuã para implementação do Pagamento por Serviços

Ambientais.

3 - Quais os principais desafios que os comitês de bacia enfrentam hoje na

Bahia, e como o Fórum tem trabalhado para superá-los?

Resposta

Bem, temos enfrentado vários desafios, o principal é a implementação dos

instrumentos de gestão em todos Comitês, alguns tem planos de bacias, outros

não, não temos cobrança no Estado, isso dificulta as ações dos Comitês.

Precisamos de uma agencia de bacia ou entidade delegatária, para facilitar a

gestão. O INEMA tem esse papel, porém é muito lento para vencer a máquina

burocrática do Estado.

4 - Você vê avanços no reconhecimento e fortalecimento do papel dos comitês

de bacias hidrográficas na política de gestão hídrica do estado?

Resposta

Eu sou otimista, acredito em mudanças, mesmo que seja difícil, especialmente

para o poder público, falta vontade política de nossos governantes, eles têm

outras prioridades, sempre a questão econômica e política falam mais alto,

questões ambientais sempre ficam em último plano.

Comitês de Bacias são aceitas por questões legais, a legislação exige esse

modelo com participação da sociedade civil, usuários e poder público. Mas, o

que prevalece é a vontade do Poder público.

5 - A presença de mulheres na liderança de comitês como o CBH Grande, CBH

Leste e CBHPIJ pode servir como um exemplo para outras regiões? Como essa

representatividade pode inspirar mudanças?

Resposta

Sempre as mulheres inspiram outras para assumirem seu papel na liderança,

isso é muito importante. Tem também o CBH Salitre com uma mulher Suely.

Dos 14 Comitês já somos 4 mulheres.

6 - Quais são as principais pautas do Fórum Baiano de Comitês para os próximos

anos, especialmente no que diz respeito à ampliação da participação social e à

gestão sustentável da água?

Resposta

Temos muito desafios, fazer gestão sem instrumentos e sem finanças, fica difícil.

A questão da ampliação da participação social é feita com muita articulação, com

o contrato da empresa de comunicação isso avançou bastante, notícias e a

visibilidade dos Comitês nas mídias sociais tem contribuído bastante.

Entrevista Lia Dognani (Presidente do CBH Grande):

Lia Dognani é e segunda mulher a presidir o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Grande. O CBH Grande fica localizado no Oeste da Bahia.

  1. Quais os principais desafios que você identifica na gestão sustentável da Bacia do Rio Grande neste novo biênio?

Resposta Lia: “O principal desafio hoje é trazer novamente os membros para uma participação mais efetiva e uma busca por recursos para que a gente consiga um conhecimento maior da nossa bacia, em virtude da amplitude da nossa bacia. A Bacia do Rio Grande ela é muito grande, como o nome mesmo diz, então a gente tem essa dificuldade de conhecimento mesmo. então é levar conhecimento, levar o aperfeiçoamento dos membros para que nós tenhamos uma discussão mais equiparada por temas que competem a nossa bacia”.

  1. Como você pretende ampliar a participação de diferentes setores da sociedade no comitê?

Resposta Lia: “Num primeiro momento, vamos buscar parcerias para que a gente consiga fazer visitas e tornar o Comitê com vários encontros itinerantes. Então a gente vai buscar levar o Comitê para onde as pessoas estão. E num segundo ponto, é explicar para a comunidade em geral, o que é o Comitê, qual é a função dele, porque não existe o conhecimento do que o Comitê faz, de como ele atua. A gente vai levar mais informação referente ao comitê em si”.

  1. O que significa, para você, ser a segunda mulher a liderar o CBH Grande?

Resposta Lia: “É muito honroso estar na presidência do Comitê, porque mostra que nós estamos aqui, e eu comento muito sobre isso, não por ser mulher, mas por competência. Nós queremos ocupar cargos por competência, não pelo meu gênero. então eu acho que é isso que faz com que a gente fique um pouco mais feliz. Hoje a gente consegue perceber dentro do Comitê, no geral, uma participação bem efetiva das mulheres. Então assim, hoje posso dizer que estamos equiparadas com a quantidade de membros, poder de discussão, acesso à informação. Para mim, é muito honroso estar nessa função hoje, enquanto mulher, em especial porque a gente busca hoje por ser por uma questão de competência e não só por ser uma mulher, por ser indígena como a Luciana, mas por competência”.

Entrevista Luciana Kiriri (2ª Secretária do CBH Grande):

Luciana é 2ª secretária do Comite da Bacia Hidrografica do Rio Grande e e primeira mulher indígena a integrar a diretoria. Ela representa a aldeia Kiriri, que fica em Barreiras, municipio que faz parte da bacia do oeste do estado.

  1. Como a sua experiência como mulher indígena pode enriquecer as discussões e decisões do CBH Grande?

Resposta Luciana: “Então como a Lia falou não é só para ocupar o espaço como Sociedade Civil e por ser indígena, mas sim por estar dentro do Comitê, ouvindo as discussões, participando na plenária e hoje estar na mesa junto com a Diretoria. E fazer a diferença, tentando levar a minha experiência, ajudando a mostrar o caminho para nossa presidente dizendo e mostrando que a gente pode ter um segmento mais ampliado e mais discutido que é a visibilidade que o Comitê dentro da Comunidades Indígenas, Quilombolas, Ribeirinhas que são de extrema importância, porque muitos deles não sabem o significado e a impotência do COmitê de bacias. Então e a gente levar isso pessoalmente, como a Lia falou como um Comitê itinerante e atuante. Por sermos mulheres, a gente vai ter que virar essa página, quebrar esse gelo que há dentro do nosso Comitê. É uma tarefa árdua,  porém prazerosa, porque a gente vai mostrar que somos capazes e vamos mudar a imagem da mulher dentro do Comitê”.

2. Quais são as principais demandas da comunidade Kiriri relacionadas à gestão hídrica que você pretende trazer ao comitê?

Resposta Luciana: “Para a gente hoje, nas comunidades originárias e trazer a tradição e cultura para mostrar o que o nosso conhecimento tradicional, que pode ser equiparado e igualado ao hoje. Vamos dizer, o conhecimento comercial. Então a gente pode unir, a gente faz a agricultura familiar, porém a gente precisa aprender as novas técnicas. Então a parte comercial, como diz o agro em outras palavras, eles têm os manejos mais práticos, que talvez a gente como indígenas até desperdice um pouco mais a água, onde eles podem dizer, faz essa drenagem aqui dessa forma,  vai ser melhor, vocês vão render mais, vão produzir um pouco mais. Não em grande escala, mas com a sabedoria que nós temos e complementar com a experiência deles. Então é uma meta que eu estou tentando ver se levo junto com a nossa presidente a essas comunidades não para dizer o que eles sabem do tradicional, e nem tirar a tradição, e sim levar novos manejos que eles possam conhecer, porque eles não conhecem. É levar conhecimento, tanto  para eles conhecerem como para trazer o conhecimento deles, uma troca que vai ser muito enriquecedora”.

3. O que a sua eleição simboliza para outras mulheres indígenas que buscam posições de liderança?

Resposta Luciana: “Quando eu recebi o convite para entrar na diretoria do Grande, eu fiquei surpresa assim como a minha comunidade toda, até porque por ser o COmitê do Grande, em uma grande área do Oeste, é uma grande oportunidade que eu estou tendo mostrando para outras mulheres, das outras comunidades, que só aqui no Oeste nós temos 14 etnias. Então eu fiquei como referência e elas apostam muito. Eu quero fazer um bom trabalho e com esse trabalho, como eu falei, quero quebrar esse gelo entre o Comitê e as Comunidades Tradicionais, quero tentar fazer esse laço e mostrar e ver as experiências tanto de ter o conhecer a nossa experiência e a gente também poder aproveitar. Porque é muito ruim ficar nessa distância sem poder a gente saber escutar o outro. Então a gente só escuta as críticas, as comunidades tem aquele fechamento que não quer se abrir por medo. Então a gente vai tentar aos poucos, abrir essa cortina  e mostrar que o outro lado não é tão negro como se fala”.

Ascom