Carnaval não pode continuar a ser a festa do lixo, analisa presidente da Cooperpac 

Maior celebração do país, o carnaval desperta paixões e um turbilhão de emoções, além de toneladas de resíduos. Quando as fantasias começam a ser guardadas, é hora de recolher o confete e as serpentinas. E as garrafas e latinhas.

Pensando na escala de São Paulo, o cenário fica ainda mais preocupante e é fundamental repensarmos a relação da cidade com esse lixo carnavalesco.

Em 2025 foram mais de 700 blocos de rua, um carnaval gigantesco e muito diverso. Apenas no pré-carnaval da capital foram recolhidas 220 toneladas de lixo, por quase 3 mil garis e mil veículos. Confira na integra (o)ecojornalismoambiental.

A festa cresceu e está exigindo mais de gestores públicos, patrocinadores e foliões, pois com ela vem o aumento significativo na quantidade de resíduos gerados. Consideramos que as associações de catadores devem ter protagonismo, apoiando a gestão pública a transformar o carnaval em uma festa mais sustentável. A reciclagem traz muito conhecimento e a capacidade de transformar esse desafio em oportunidades.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) completa quinze anos em 2025, e, apesar dos avanços, ainda é tímida na inclusão de catadoras e catadores para a destinação final. A lei cita a categoria mais de uma dezena de vezes, evidencia sua importância para a gestão efetiva, ambientalmente adequada e socialmente justa dos resíduos. Eles são, sem dúvida, uma peça-chave para a construção de soluções que diminuam o impacto ambiental e que gerem benefícios econômicos e sociais.

Os catadores não só ajudam a coletar e separar o lixo de forma correta, mas a destinação adequada para que o material reciclável seja reaproveitado. 

Sabendo do potencial desse conhecimento, algumas grandes empresas estão financiando a remuneração de catadores para que atuem na coleta de recicláveis durante o carnaval de 2025. Embora a iniciativa seja um passo positivo, o potencial dessa parceria é muito maior do que a participação de apenas 200 catadores no evento, quando há, pelas estimativas da própria categoria, mais de 10 mil só na cidade de São Paulo. O projeto é uma oportunidade para ampliar o engajamento de catadores em uma escala muito maior, transformando a gestão de resíduos no carnaval em uma atividade mais eficiente e inclusiva.

Sancionada em 2023, a Lei estadual nº 17.806 obriga que eventos públicos e privados façam o gerenciamento adequado dos resíduos gerados, priorizando a contratação de cooperativas de catadores para esse serviço. No entanto, quase dois anos depois, a lei ainda não foi regulamentada. Sua aplicação poderia ampliar significativamente o volume de resíduos recuperados e, consequentemente, reduzir o impacto ambiental dos eventos.

Quando falamos de maior quantidade de resíduos recuperados, estamos falando de benefícios concretos: a menor necessidade de extração de recursos naturais, a redução dos gastos de energia e água na produção de novos produtos e o fortalecimento da inclusão social e econômica dos catadores autônomos. 

Um bom trabalho de gestão de resíduos também resulta na diminuição do volume de lixo enviado aos aterros e lixões, o que contribui para a redução dos impactos ambientais causados por esses locais.

Não se trata apenas de uma questão ambiental, mas de justiça social e crescimento econômico. O carnaval pode ser, sim, uma grande festa sustentável, mas para isso é necessário que as políticas públicas previstas no papel se tornem realidade. É urgente que o poder público e os organizadores de eventos deem o devido reconhecimento e espaço aos catadores e catadoras. A festa é nossa, mas a responsabilidade pela sua gestão também é.

Valquíria Cândido da Silva-Mãe de quatro filhos e presidente da Cooperpac, cooperativa de catadores do Grajaú.  

O eco jornalismo ambiental Foto ilustração PMRJ