Artigo - Empatia: a arte de cuidar com compaixão

O século XXI é caracterizado pela interconexão global das pessoas; entretanto, o mundo enfrenta muitos desafios inerentes à empatia nas convivências casuais.

Nesse contexto, percebe-se que a rede mundial de computadores conecta indivíduos, mas também propaga a antipatia. Na realidade, estamos virtualmente juntos, mas separados pela fria indiferença dos corações descomprometidos.

Ademais é relevante observarmos que a palavra empatia passou por importantes transformações ao longo da nossa história. Originalmente derivada do grego empatheia, significava um estado de emoção ou paixão intensa.

Foi no século XIX, na Alemanha, que o termo empatia adquiriu um novoentendimento, relacionado ao ato de ‘colocar-se dentro’ de uma obra de arte, projetando nela os próprios sentimentos. Nesse contexto, destacava-se a análise das expressões emotivas dos indivíduos, um reflexo das influências estéticas e filosóficas da época.

Posteriormente, o termo empatia foi adaptado para o inglês com o significado de se colocar no lugar do outro. Embora falar sobre altruísmo seja comum, praticá-lo de fato é uma raridade. Mais do que uma característica desejável nas relações pessoais, a mútua compreensão é uma qualidade essencial para fortalecer os laços humanos e,genuinamente, moldar o caráter.

Não é por acaso que Robin Sharma, em ‘O líder que não tinha título’, expõe que "a empatia é a qualidade mais importante do caráter". Por esse motivo, uma pessoa empática pode influenciar positivamente ao seu redor, porque é capaz de apreender e agir de acordo com as necessidades de cada um.

Nesse sentido, a reflexão de Confúcio, em ‘Os Analectos’, é especialmente relevante quando diz que "a única virtude que podemos praticar sem limite é a compaixão". Essa virtude, ilimitada em sua essência, fortalece nossas relações e nos torna mais humanos.

Essa virtude de se colocar no lugar do outro, combinada com a simpatia, nos leva a uma percepção mais profunda das dores e necessidades dos indivíduos, permitindo-nos agir com mais sensibilidade recíproca.

Juntas, compaixão e empatia não apenas fortalecem os laços interpessoais, mas também promovem um mundo mais solidário e justo.Trabalhando em conjunto com uníssono propósito que é se importar uns com os outros.

Dalai Lama, em ‘Arte da Felicidade’, nos ensina que "a verdadeira compaixão significa não só sentir a dor dos outros, mas agir para aliviá-la". A propósito, um ‘sinto muito’ não mata a fome de quem necessita de alimento; o que realmente enche estômago de um faminto é o feijão e o arroz que ele consome.Palavras pensadas, palavras prometidas, palavras escritas são só palavras. 

Dizer ‘um vou orar por você’ ou ‘vou torcer por você’ quando se tem os meios para ajudar é como esperar milagres sem ter fé. Isso é o mesmo que chupar ospróprios dedos esperando sair leite algum dia. A verdadeira compaixão não se limita às palavras; ela se manifesta em ações que transformam vidas deprimidas.

É com esse pensamento que Carl Jungreflete sobre a importância da empatia em ‘Memórias, Sonhos, Reflexões’, destacando"o que é odiado em nós mesmos e nos outros quase sempre é o que menos compreendemos". Veja o caso abaixo:

– Saudações de paz, senhorita Empatizes! Sou Atordoado, um viajante à procura de um alento para o refrigério do meu pobre espírito. Por piedade, peço que olhe mais profundamente para minha causa e derrame sobre mim a compaixão que tanto careço. Se você não me ajudar estarei totalmente perdido nessa viela.

– Paz e bem, querido Atordoado! Sua voz carrega um tremor inquieto, e percebo que está muito pálido. Sua respiração está descompassada e o seu coração parece exausto. Fale comigo, meu amigo. Estou aqui para te escutar com toda a atenção que você merece.

– São tantas coisas acontecendo que estou à beira da loucura. Falta quase tudo: emprego, comida, saúde, roupas, namorada, casa... até mesmo pequeno conforto. Muitos dizem que sou muito inteligente, mas de que adianta inteligência com tanta pobreza?

– Calma, calma. Você não está sozinho nessa batalha. Vamos dialogar sobre seus desafios e dividir essa carga juntos. Ora, é melhor caminhar com alguém do que viver isolado numa ilha de solidão. O que estiver ao meu alcance, pode considerar seu. Estou aqui para ajudar, de coração.

Esse tipo de vivência não é comum de perceber no nosso dia a dia. Ainda mais numa sociedade egoísta, embriagada de orgulho e soberba, que só protege o seu próprio interesse. Tudo só será executado se e somente se houver grande lucratividade.Vou ganhar o que com isso?

-Socorro, socorro me ajude estou infartando. Nícolas pegue o carro e me leve na UPA de Juazeiro, meu netinho. Estou quase morrendo minha gente.

- Vovó a senhora está onde agora?

- Estou no Monte Castelo, na rua Saramandaia.

- Vamos vovó vou te salvar. Segura firme nas minhas mãos. Ouvir um amigo dizer que na UPA de Juazeiro o atendimento é nota 10. Ele disse que vamos ser, extraordinariamente, surpreendidos.

- Boa madrugada seu guarda me chamo Nícolas. Por favor, onde fica a recepção para um atendimento de urgência e emergência dessa unidade?

- Não tenho obrigação de ensinar isso. Meu dever aqui é olhar o portão da UPA. Você é cego seu mala? Não sabe ler? Vaza daqui com esse mimimi. Vou é ver meu zapzap rapaziada...

- Vem vozinha Aria. Vou procurar alguém para nos ajudar. Olha lá uma atendente. Por gentileza, a senhora pode socorrer minha pobre vozinha que está com muitas dores?

- Pegue aqui a ficha 2025 e fiquem sentados, calados e sem reclamar. Saibam que vocês não podem desacatar funcionário público. É lei.

-Minha gente do céu, já se passaram três horas e ninguém veio atender minha querida vozinha! É assim o funcionamento daqui: sofremos na chegada e na saída. E, quando ligamos para o programa de Geraldo José para relatar nossas dores, a atendente da unidade ainda liga para a rádio dizendo que a denúncia é mentirosa. Até quando vamos tolerar essa falta de empatia?

- Isso é um problema seu e de sua vó. Quem manda não ter plano de saúde. Vai ao posto de saúde de seu bairro e se vira por lá.

O verdadeiro empático traz na sua essência as virtudes do amor.Não é forçado a fazer o bem e nem a ser humilde.É por essa ideia que Carl Rogers em ‘a way of being - um jeito de ser’, defende que a prática da empatia é uma habilidade crucial em muitos processos terapêuticos.

Essa compreensão profunda do outro é um dos pilares de sua abordagem terapêutica, que envolve escuta ativa e acolhimento sem julgamentos. É com essa tese que "quando você realmente entende o ponto de vista do outro, isso o muda", diz Rogers.Essa mudança vem do conhecimento pleno exercido nas relações ecológicas.

No entanto, empatia não é simplesmente "ver o mundo com os olhos do outro", como observa Mark W. Baker,mas sentir com o coração do outro, como bem descreveu Alfred Adler. É poder se interessar no bem coletivo e diminuir o conceito exagerado de si mesmo.

Esse egocentrismo desinteligente é verificável em muitos casos da nossa vida. Se doar exige negar-se a si mesmo. É se importar pelo bem-estar do outro primeiro. Isso é fácil? Quem disse que é? Escuta o diálogo:

- A paz do Senhor minhas irmãs e meus irmãos amados. Hoje, vamos ouvir um pequeno testemunho da nossa irmã Fogo Puro. Ela vai falar sobre um grande livramento que o filho dela recebeu.

-Amém, pastor Salomão! Ô glória, glória a Deus! Quero compartilhar com a Igreja do Senhor que meu filho sobreviveu a um acidente gravíssimo. Eu invoquei ao Deus eterno, orando: 'Senhor, mesmo que todos pereçam, meu filho não será atingido!' Sou uma santa serva do Senhor e Ele sempre livrará os meus familiares de tudo.

- Misericórdia, irmã Fogo Puro! Igreja, vamos fazer uma oração agora pelos nossos familiares e também para Deus trabalhar no coração da nossa irmã Fogo Puro.

Dizemos frases como: ‘Deus está do meu lado, não do seu’, ‘não tenho culpa se sou o escolhido’, ‘comigo é assim: primeiro eu, depois eu e logo apóseu de novo’, ou ainda ‘não é meu problema se você não entende que sou a cara da riqueza’.Escancaramos o culto ao ego negativo.

O episódio acima demonstra que, conscientes ou não, freqüentemente externamos o individualismo nas entrelinhas de nossas palavras. Ninguém é tão paupérrimo que não tenha condições de ser empático.Praticamos empatia quando doamos o nosso tempo, nossa atenção, disposição da escuta ativa e na ajuda de resoluções de conflitos.

Se colocar no lugar do outro vai além de resolver os desafios do mundo. É ser solidário e mais amável com o seu próximo.Quem é o meu próximo? Tudo.Ninguém consegue ser auto-suficiente para suportar a felicidade sozinho.

- Boa tarde, dona Antipatia, posso te pedir um grande favor? Estou necessitando que me ajude a seguir em frente confiantemente.

- Boa tarde Aluno (sem luz). Infelizmente,não posso te ajudar. Na vida é assim mesmo. Se conforme. Ou a gente se dá bem ou a gente se lasta (esfaqueia).

- Fique bem, dona Antipatia. Agradeço imensamente pela sua sinceridade sem afeto, atenção, solidariedade e amor. Agora, vou procurar alguém que realmente se importe em ajudar. Existem pessoas boas no mundo e vou encontrá-las.

- Vai, vai, vai que já estou de saco cheio de você aqui nessa lengalenga.

- Boa noite, dona Esperança, aqui é Aluno.Por gentileza, ajude-me a resolver esse desafio da minha vida.

- Meu filho, não desista de esperar com confiança. Quem espera em Deus nunca ficará desamparado,envergonhado e nem frustrado. O barco pode balançar, a chuva pode chacoalhar e o vento pode amedrontar, mas mantenha a esperança firme no caminho estreito.

- Gratidão, querida Esperança!

Pensou que era moleza ser empático? A empatia vai muito além das expressões acima. Considero complexa a ideia de que uma pessoa consiga, verdadeiramente, se colocar no lugar da outra. O desafio é conseguir ser empático.

Será que um 'eu te entendo' ou 'eu me coloco em seu lugar' são realmente capazes de vivenciar plenamente o que o outro está sentindo? Existem maneiras mais profundas de demonstrarmos empatia?

A empatia pode se apresentar com diversos formatos. Dentre esses, temos a empatia cognitiva (que é o compartilhamento de pensamentos e sentimentos alheios). Empatia emocional (ser capaz de sentir as mesmas emoções do outro). Empatia compassiva (essa vai além das palavras, porque quer sempre ajudar).

Não são as palavras que nos fazem empáticos e sim as nossas ações concretas. Quando o indivíduo defende a tese de que sempre se coloca no lugar do outro e, naquela mesma noite, consegue dormir em paz diante desse lago de sangue humano, isso soa como uma piada de péssimo gosto para os que estão numa espera dolorosa.

É por essa razão que o sofrimento humano, no que diz respeito à espera, se torna uma experiência inevitável e, muitas vezes, angustiante de suportar. Por isso, Paulo Coelho, em ‘O Alquimista’, nos lembra que: “esperar é doloroso. Esquecer é doloroso. Mas não saber o que fazer é o pior tipo de sofrimento”.

Ademais, a empatia não se limita às situações de sofrimento. Como bem afirmou Meryl Streep, “a capacidade de ser empático é o dom mais humano”. Socializando dessa ideia, Daniel Goleman, em ‘Inteligência Emocional’, faz uma dessemelhança importante: “A compaixão é o desejo de ajudar; a empatia é entender o que é estar naquela situação”.

Portanto, minhas amigas e meus amigos,a empatia nos permite agir com mais calma, solidariedade, honestidade, consideração, equilíbrio, verdade, justiça, perdão, gratidão, amor, carinho e nobreza, tanto no nível pessoal quanto social. Afinal, sabemos que o mundo dá muitas voltas:hoje sou eu quem necessita da sua compreensão; amanhã, talvez, seja você. Como está escrito em Filipenses 2:4“cada um cuide, não somente dos seus próprios interesses, mas também dos interesses dos outros”.

Josiel Bezerra - Professor de Biologia